José das Dornas era um lavrador abastado, sadio, e de uma tão feliz disposição de génio, que tudo levava a rir; mas desse rir natural, sincero e despreocupado, que lhe fazia bem, e não do rir dos Demócritos de todos os tempos - rir céptico, forçado, desconsolador, que é mil vezes pior do que o chorar.
Em negócio de lavoura, dava, como se costuma dizer, sota e ás ao mais pintado. Até o Sr. Morais Soares teria que aprender com ele. Apesar dos seus sessenta anos, desafiava em robustez e actividade qualquer rapaz de vinte. Era-lhe familiar o canto matinal do galo, e o amanhecer já não tinha para ele segredos não revelados. O sol encontrava-o sempre de pé, e em pé o deixava ao esconder-se.
Estas qualidades, juntas a uma longa experiência adquirida à custa de muito sol e muita chuva em campo descoberto, faziam dele um lavrador consumado, o que, diga-se a verdade, era confessado por todos, sem estorvo de malquerenças e murmurações.
Diz-se que "quem mais faz menos merece" e que "mais vale quem Deus ajuda do que quem muito madruga", e não sei o que mais; será assim; mas desta vez parecia que se desmentira o ditado, ou pelo menos que o facto das madrugadas não excluíra o auxílio providencial, porque José das Dornas prosperava a olhos vistos.
"As Pupilas do Senhor Reitor", Júlio Dinis
(Júlio Dinis nasceu no dia 14 de Novembro de 1839. Morrem em 1871.)
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