domingo, 16 de dezembro de 2018

Em palhas deitado 18

O almocinho de dominguinho, graças a Deus
Um dominguinho como de costume e Deus manda. Missinha das onze, homiliazinha com palavrinhas a abater e um que outro puxãozinho de orelhas para temperar, uns acenozinhos ao rebanho, umas lambidelas consentidas na mão santa, a da bênção e do cachucho, e depois... o almocinho. O almocinho de dominguinho: três pratos, tal qual a Santíssima Trindade e o outro assunto que não vem ao caso. Duas horas à mesa e sempre a dar-lhe, como se fosse castigo, penitência. "Ui! Comi que nem um abade" - desabafou, num arroto final. "Nada de modéstias, Eminentíssimo e Reverendíssimo, afinal de contas sois Cardeal, Cardeal" - acudiu o solícito secretário, jovem presbítero, com as maiúsculas numa mão e o bicarbonato de sódio na outra.


Os cónegos dividem-se em três partes
Há coisa de quarenta anos, os cónegos não eram uma classe respeitada por aí além, mesmo ou principalmente no interior da Igreja. Naquele tempo, cónegos eram anedotas, contadas por padres que não eram cónegos. Inveja? Sei lá eu. Parece que o tique vinha de trás e atiravam a culpa ao Eça.
Os cónegos que então conheci afiguravam-se-me criaturas patuscas, isso é certo. Geralmente baixinhos, barrigudos e corados, sebentos às vezes. Os cónegos eram uns cromos, caricaturas deles próprios. Também não sei se ficaram assim depois e por causa de terem ido para cónegos ou se aqueles é que eram os critérios de selecção.
Uma vez, um padre recém-ordenado, mestre e amigo, ensinou-me que a classe dos cónegos se dividia em três categorias: "os cónegos de merda, a merda de cónegos e os cónegos a sério" - que seriam os da sé propriamente dita, eventualmente os cónegos com cargo no cabido.
Como funciona agora com os cónegos, desconheço. Tenho de falar com o meu amigo antigo, que também já é cónego, e perguntar-lhe a que categoria é que ele pertence...

 
Lições de História: a Távola Redonda
Quando a corneta, ou olifante, tocou para o tacho, eram mais de quatro mil cavaleiros, de faca e garfo em punho como se fossem para uma justa, mas sentados e com um apetite escancarado e lavajão, posto que estávamos na Idade Média, e higiene e boas maneiras não eram com eles naquele tempo. Manifestamente atónito e arreliado assim assim, o rei Artur fez contas à vida, pelos dedos, apaziguou a algazarra da turba colorida e apenhachada com meia dúzia de flechas cirurgicamente colocadas e obviamente fatais, invocou o regimento e colocou um ponto de ordem à mesa. O seguinte: "Embora nunca tenhamos realmente existido, está historicamente provado que vocês não podem ser mais de doze como os apóstolos, talvez 24, ou, para não me chamarem forreta, temos sala para 150, fora as crianças, que pagam metade. Agora, quatro-mil-cento-e-quarenta-e-cinco adultos e gordos, menos os seis que eu vindimei, já é uma escandalosa moinice. De onde é que me apareceu esta gente toda, que ainda por cima não traz o Magriço, que até nem dá despesa nenhuma, como o próprio nome indica? Por São Jorge, isto é a Távola Redonda, não é o Montepio"...

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