segunda-feira, 18 de maio de 2020

Heliodoro Baptista 4

Presságio, minha ave

(Ao Gringas e à Maria,
poetas de outro blue-jazz) 

Estou doente como um cão
num barco içado pela babugem
no ritmo índico puro da monção;

O homem que eu disse ser,
inescrupuloso, de rara penugem,
é o capitão deste barco a arder
no seu cachimbo em forma de coração;

Longe, a ilha de seu destino, é vaga ideia
em qualquer privado jardim da consolação:
céu, mar, gaivotas de fogo, o pé-de-meia
de quando eu ainda pensava ter razão.

Este homem recorta-se no vosso céu de aço;
Ventos temporais, estrelas caídas de fronte,
O cachimbo sem tabaco, o declinado horizonte
E o coqueiro híbrido na mão insurrecta, largo o espaço.

Já não estou, afinal, doente; para sempre fui e morri.
Mas pela noite áfrica, oceânica, regresso. Renasci.

Heliodoro Baptista

(Heliodoro Baptista nasceu no dia 19 de Maio de 1944. Morreu em 2009.)

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