Para mim, eram os relógios apenas discípulos de meu avô, que com eles se entendia maravilhosamente, como discípulos disciplinados e compreensivos. Meu avô levava-os a sério. Quando qualquer coisa de anormal, de agradável ou desagradável, acontecia, ele inspecionava os relógios. Porque eles não batiam horas, mas contavam histórias - quedas de ministérios, reunião de conspiradores, de antiescravistas e republicanos, a deposição de Américo Brasiliense ou os últimos momentos do governo do Marechal Deodoro. Em tudo isso, o romantismo e o realismo do meu avô se entrelaçavam e ele dava aos relógios a presidência dos acontecimentos mundiais. Certa manhã chegou a dizer-me:
Você não pode alcançar, menino, o significado do relógio na história da civilização. Pense bem: sem ele não haveria consciência histórica e demarcação de valores. Kant não teria escrito a Crítica da razão pura, nem Napoleão teria perdido a batalha de Waterloo!
"Dias Lidos e Vividos", Cândido Motta Filho
(Cândido Motta Filho nasceu no dia 16 de Setembro de 1897. Morreu em 1977.)
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