Era um inverno zangado, daqueles de levar tudo à frente, e aconteceu assim, no velho tempo do desconfinamento quotidiano. Mal rompeu o dia, e não foi bem um romper, saltaram aos magotes para o Passeio Atlântico, ali em baixo. São fáceis de identificar, famílias inteiras vestidas de fato de domingo e telemóvel armado em máquina fotográfica, só lhes falta o merendeiro. Querem saber com os próprios olhos se a Praia de Matosinhos foi engolida pelo furacão, se pura e simplesmente desapareceu do mapa. Ficam desiludidos e nem sequer tiram a roupa: a praia está ali normalíssima da vida, inteira, cheia de gente a jogar à bola. Os magotes desmobilizam, as famílias tornam a casa, telemóveis murchos, num desgosto que só visto. Vão comer frango de churrasco, comprado, e assistir à desgraça como deve ser na televisão. Nus. Para a semana, se Deus quiser, vão de bicicleta visitar um eucaliptal que é uma categoria. São naturistas militantes, turistas de natureza. Quero dizer: de natureza... duvidosa.
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