sábado, 18 de maio de 2019

Mário de Sá-Carneiro 7

Abrigo

Paris da minha ternura
Onde estava a minha Obra -
Minha Lua e minha Cobra,
Timbre da minha aventura.

Ó meu Paris, meu menino,

Meu inefável brinquedo...
- Paris do lindo segredo
Ausente no meu destino.

Regaço de namorada,

Meu enleio apetecido -
Meu vinho de Oiro bebido
Por taça logo quebrada...

Minha febre e minha calma -

Ponte sobre o meu revés:
Consolo da viuvez
Sempre noiva da minha Alma...

Ó fita benta de cor,
Compressa das minhas feridas...
- Ó minhas unhas polidas,
- Meu cristal de toucador...

Meu eterno dia de anos,

Minha festa de veludo...
Paris: derradeiro escudo,
Silêncio dos meus enganos.

Milagroso carrossel

Em feira de fantasia -
Meu órgão de Barbaria,
Meu teatro de papel...

Minha cidade-figura,

Minha cidade com rosto...
- Ai, meu acerado gosto,
Minha fruta mal madura...

Mancenilha e bem-me-quer,

Paris - meu lobo e amigo...
- Quisera dormir contigo,
Ser todo a tua mulher!...

Mário de Sá-Carneiro

(Mário de Sá-Carneiro nasceu no dia 19 de Maio de 1890. Morreu em 1916.)

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