segunda-feira, 6 de maio de 2019

Luiz Pacheco 7

- Gostas de broche? - pergunto e encaro-o fito nos olhos, muito sério, muito natural.
- An, nem por isso - responde sempre calmo.
- Pois é só o que eu te posso fazer - digo, como se me desculpasse de não ser o Calouste Gulbenkian.
- E quanto me dá? - pergunta desagradável feita em tom meramente comercial.
- Olha, não te posso dar nada - diz o falso Calouste -, dava-te se tivesse, mas estou tesíssimo, não tenho um tostão, já o tabaco foi fiado na pensão, só amanhã é que recebo um vale de Lisboa, amanhã às duas e meia.

- ‘tão, nada feito - diz a sua honra camponesa, e pela primeira vez noto como me apetecia aquele corpo, ser dono ou servo daquele aparato movediço de carne, pele, ossos, pêlos, força. E também me parece que ele está pronto a ir atrás de uma promessa, duma mentira qualquer, e que a recusa pela venda comercial é onde ele esconde a sua pronta adesão. Talvez o seu vício. Mas para comercial, comercial e meio.

"O Libertino Passeia por Braga a Idolátrica o Seu Esplendor", Luiz Pacheco

(Luiz Pacheco nasceu no dia 7 de Maio de 1925. Morreu em 2008.)

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