quinta-feira, 16 de agosto de 2018

Óscar Ribas 4

Como um mar de palavras, o burburinho dilatava-se até longe, indo morrer por detrás das montanhas. Era o falatório, eram as gargalhadas, eram as cantigas em coro. A vila, risonha em sua prosperidade, representava, como anteriormente o Dondo, um verdadeiro empório africano.
Nesse tempo distante, um colono - e quantos como ele? - vivia amancebado com uma escrava, cuja lenda, amortalhada na lembrança do indígena, se desdobra numa auréola de saudade. Maria - assim se chamava ela.
Afeita ao látego desde a puberdade, nutria pelo amo uma submissão canina. Para a execução de qualquer coisa, nem sempre precisava de ordens: um simples desejo bastava. Sim, só um desejo dele bastava, porque o seu corpo, a sua vida, lhe pertenciam totalmente. Mercadoria pensante, farrapo de alma, que mais podia fornecer a seu proprietário, senão a passividade do irracional? Semelhante ao capim, rasteiro ao solo para melhor o favorecer, também a pobre escrava, desprezível em sua humildade, em cuidados queria agradar ao dono de sua existência.


"Ecos da Minha Terra", Óscar Ribas

(Óscar Ribas nasceu no dia 17 de Agosto de 1909. Morreu em 2004.)

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