terça-feira, 3 de julho de 2018

Adolfo Casais Monteiro 4

Paz aos mortos

Detestei sempre os arquitectos de infinito:
como é feio fugir quando nos espera a vida!
Nunca tive saudades do futuro
e o passado... o passado vivi-o, que fazer?!
- e não gosto que me ordenem venerá-los
se eu todo não basto a encher este presente.

Não tenho remorsos do passado. O que vivi, vivi.
Tenho, talvez, desprezo
por esta débil haste que raramente soube
merecer os dons da vida,
e se ficava hesitante
na hora de passar da imaginação à vida.

As pazadas de terra cobrindo o que já fui
sabem mal, às vezes; noutros dias
deliro quando lanço à vala um desses seres tristonhos
que outrora fui, sem querer. 


"Sempre e Sem Fim", Adolfo Casais Monteiro

(Adolfo Casais Monteiro nasceu no dia 4 de Julho de 1908. Morreu em 1972.)

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