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D. António José Rafael, bispo de Bragança e Miranda, é fortemente contestado pelo modo como governa a sua diocese. Primeiro teve de haver-se com a "guerra dos cónegos", depois um documento com milhares de assinaturas exigiu ao núncio apostólico a imediata substituição do prelado, agora um novo abaixo-assinado, com os nomes de muitos notáveis do Nordeste, foi enviado ao Papa reivindicanto o de sempre: a demissão imediata de D. António. É mais um episódio de uma novela que mete intriga, traição, mentira, política, cartas anónimas, padres e polícias.
A carta ao Papa tardou mas não faltou. Estava da forja desde os finais do ano passado, chega agora à luz do dia e coloca em causa a acção e a ortodoxia pastoral de D. António Rafael à frente da igreja bragançana. Tal como se anunciava, este é um documento assinado por pessoas "de peso, importantes, de categoria, entre os quais alguns membros da Assembleia Municipal" de Bragança. De acordo com A Voz do Nordeste - jornal ligado à Igreja mas que, na região, tem servido de porta-voz aos críticos do prelado -, cuidou-se, nesta missiva ao Vaticano "não de juntar muitas assinaturas, mas de procurar apenas assinaturas de pessoas cuja idoneidade intelectual e moral fosse inquestionável". Os signatários são, entre outros, "alguns autarcas, engenheiros, professores, funcionários públicos e médicos", e o texto é "curto e sem os adjectivos menos simpáticos contra o bispo utilizados no documento enviado há um ano para a Nunciatura Apostólica."
Em cinco parágrafos, os chamados notáveis bragançanos denunciam o "ambiente de desunião" vivido na diocese logo "pouco tempo depois que fora nomeado bispo residencial o Senhor D. António José Rafael." Um "ambiente aflitivo, começado entre bispo e clérigos" e que "tem vindo a alastrar-se, sobretudo nas zonas mais cultas", gerando "um clima de guerra e descrédito" que "escandaliza crentes e não crentes". Descontentes com o silêncio da Nunciatura em relação ao primeiro protesto, os signatários pedem agora que o Papa "intervenha com a Sua autoridade de pastor universal da Igreja Católica", por forma a que "a unidade e a paz voltem a reinar nesta tão martirizada diocese."
Esta é, em boa verdade, um versão soft de uma crítica "qualificada", em contraste evidente com os milhares de assinaturas que no ano passado exigiam, sob desclassificativa adjectivação, a substituição de D. António. Diagnosticando ao bispo doença "psicológico-mental", e acusando-o de "inacessível, antagónio, egoísta, soberbo, insensível, ditatorial, intriguista, prepotente e descontrolado", o documento enviado incialmente ao representante da Santa Sé em Portugal pretendia espelhar a "perplexidade e o sofrimento", o escândalo de milhares de almas bragançanas, perante o "estado lastimoso da diocese".
Este documento surgiu após a substituição do padre Sobrinho Alves na reitoria do Seminário e a consequente cessação das suas missas na Igreja de Nossa Senhora das Graças - onde o sacerdote seria muito popular -, e pretendia expor o protesto de milhares de leigos contra a atitude do bispo. Muito do clero local assinava também a carta contra o chefe, não se dispensando da missão de mentores espirituais.
(Primeira parte de um trabalho que escrevi para a revista Sábado em Dezembro de 1991, na sequência de uma entrevista que fiz ao bispo de Bragança e Miranda, para o jornal O Primeiro de Janeiro, um ano antes. António José Rafael morreu hoje, com 92 anos. Amanhã volto ao assunto.)
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