segunda-feira, 26 de junho de 2017

Em defeso do futebol 16

Foto GASPAR DE JESUS

No tempo em que os animais falavam
Houve um tempo em que os presidentes dos maiores clubes de futebol falavam com os jornalistas e até convidavam os directores dos jornais para jantar. Todos eram tratados por igual e quem tivesse unhas que tocasse viola. Mas isso foi muito, muito antigamente, no tempo em que os animais falavam e não havia telemóveis. Depois, conta-se que os presidentes dos maiores clubes resolveram dividir os jornalistas em dois grandes grupos: os que levavam recados e os que levavam pancada - e deixaram de falar aos restantes. Mais tarde, os presidentes dos maiores clubes criaram as suas próprias televisões e passaram a ser "entrevistados" pelos seus próprios jornalistas. E agora, quando se dignam descer até ao ecrã das televisões generalistas, exigem tratamento de primeiro-ministro. São outros tempos... 

Gosto muito de todavias
Na rádio, ouvi aqui atrasado uma pequena entrevista telefónica feita ao presidente de um clube de futebol da primeira divisão. Claro que o entrevistado não era nenhum dos três cabeçudos - esses não têm telefone (por causa da polícia), só dão "grandes entrevistas" nas televisões mais ou menos nacionais, em directo e exclusivo, ou, quando lhes apetece, mandam recado pela rapaziada que mantêm nas redacções. E também não era nenhum daqueles que querem ser cabeçudos quando forem grandes. Era somente o presidente de um clube de futebol de passagem pela primeira divisão.
E querem saber? Gostei do que ouvi. Em apenas três ou quatro frases telegráficas, num discurso simples e honesto, o presidente utilizou pelo menos duas vezes a conjunção adversativa (ainda se chamará assim?...) todavia. Ora, eu gosto muito de todavias. O facto de haver um presidente de um clube de futebol da primeira divisão que respeita o trabalho dos jornalistas e tem educação bastante para atender o telemóvel e permitir a gravação de uma conversa, nos dias que correm e por si só, é para mim uma enorme novidade, um motivo de justificado aplauso. E ainda por cima as todavias falaram-me ao coração. Este presidente, digo já, passou a merecer a minha mais sincera admiração.
Apesar de nenhuma das suas todavias estar devidamente contextualizada. Ou, como se diz agora à la française, "mesmo que" nenhuma das suas todavias estivesse devidamente contextualizada. Atirou-as ao calhas e quem quiser que fuja. Quero lá saber: o homem é do futebol, não é gramático. Podia ter dito "picaretas" e, isso sim, seria perigoso. Gosto muito de todavias, mas as todavias não são tudo...

2 comentários:

  1. Gosto do teu ar distinto e compenetrado companheiro Hernâni. Os dois que que estão de costas não sei quem são, mas dos que estão de frente alguns já fizeram a última viagem...
    Abraço.

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