(Versão revista e aumentada, publicada no meu blogue Mistérios de Fafe)
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quarta-feira, 13 de agosto de 2025
Cruzes, canhoto!
O canhoto é o diabo. O demónio. Satanás. O que escreve com a mão esquerda. O que chuta com o pé esquerdo. O canhestro. Ou o desajeitado. Ou o talão que não se destaca no livro de recibos, guias ou cheques. Ou o pedaço de lenha para a fogueira, o pau torto, grosso ou nodoso. Em Fafe, é também o arrocho, o toro, o tronco, o toco, a pernada decepada, o cepo. E a mulher do canhoto é a canhota. Que é uma variedade de amêndoa algarvia, de fruto arredondado, com casca dura e miolo elíptico alargado de tonalidade clara. Ou um moinho de água, uma azenha. Ou a espingarda, na tropa. É. A língua portuguesa pela-se por uma boa brincadeira.
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domingo, 13 de abril de 2025
Dava-te um beijo, mas não tenho...
Dizem-me que as palavras já não valem nada. Mentira. As palavras são cada vez mais poderosas, as palavras dominam as nossas vidas. As palavras até tomaram o lugar dos afectos, dos carinhos. Reparem. Antigamente davam-se beijos, davam-se abraços. Agora dizem-se beijos, dizem-se abraços. O gesto ancestral e puro foi substituído pela retórica etiquetada, o contacto físico acabou vergado ao esboço da intenção - à simulação. À dissimulação?
Dizemos "Beijinhos", dizemos "Abraço", dizemos olá de boca, e assim ficamos. Pelas palavras. Beijos e abraços são só vocábulos, paleio. Mantemos uma distância alegadamente higiénica entre nós, os alegados amigos uns dos outros. Amigos por computador. Dizemos. Enviamos. Remetemos. Aproveitamos a oportunidade para. Ao telefone, por escrito, ao vivo na pressa da rua, na patetice dos emojis. Dar a sério (à séria, se lido em Lisboa) é que não. Ninguém dá nada a ninguém - nem sequer beijos, nem sequer abraços. Fazemos votos de. "O que lhe estimo é um magnífico beijo", "Desejo-lhe um excelentíssimo abraço". E nisto estamos.
É. Olhem bem à volta: as palavras estão em alta, navegam de vento em popa. As palavras. O falatório. Nunca tanto se palavrou. Nunca se falou tanto, nunca se mentiu tanto. Isso. O que verdadeiramente está em crise é a palavra, a palavra singular e definitiva, essa vaga memória de uma honra démodée que se arrasta pelas ruas da amargura - abandonada, pobre, cega e nua. Mas isto, claro, sou eu a dizer e são apenas... palavras, palavras, palavras.
Dizemos "Beijinhos", dizemos "Abraço", dizemos olá de boca, e assim ficamos. Pelas palavras. Beijos e abraços são só vocábulos, paleio. Mantemos uma distância alegadamente higiénica entre nós, os alegados amigos uns dos outros. Amigos por computador. Dizemos. Enviamos. Remetemos. Aproveitamos a oportunidade para. Ao telefone, por escrito, ao vivo na pressa da rua, na patetice dos emojis. Dar a sério (à séria, se lido em Lisboa) é que não. Ninguém dá nada a ninguém - nem sequer beijos, nem sequer abraços. Fazemos votos de. "O que lhe estimo é um magnífico beijo", "Desejo-lhe um excelentíssimo abraço". E nisto estamos.
É. Olhem bem à volta: as palavras estão em alta, navegam de vento em popa. As palavras. O falatório. Nunca tanto se palavrou. Nunca se falou tanto, nunca se mentiu tanto. Isso. O que verdadeiramente está em crise é a palavra, a palavra singular e definitiva, essa vaga memória de uma honra démodée que se arrasta pelas ruas da amargura - abandonada, pobre, cega e nua. Mas isto, claro, sou eu a dizer e são apenas... palavras, palavras, palavras.
P.S. - Hoje é Dia Internacional do Beijo.
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sábado, 1 de março de 2025
Apois, se não for antes
No português do Brasil, a palavra apois quer dizer pois, já que, pois que, visto que, como se fosse, me conte. No português de Fafe, isto é, no fafês, apois era corruptela, sinónimo e substituto popular de depois, portanto querendo também dizer após, mais tarde, posteriormente, a seguir. "Vai indo, que eu vou apois". E era assim que se contavam as histórias antigamente: - Apois, disse o rei à sua princesa...
(Publicado originalmente no meu blogue Mistérios de Fafe)
sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025
Havia guichos e guichas
Guicho é esperto, inteligente, arguto, atento, muito vivo, buliçoso. Guicho, em Fafe, era elogio. E havia guichos e guichas. E os "ches" de guicho e guicha eram, como sempre, carregados, robustos. "O meu neto é muito guicho", dizia-se. "Era uma velhinha toda guicha", escrevi algures a propósito de determinada fafense excelentíssima. Alguém que recuperava a olhos vistos de uma doença grave ou prolongada, também estava ou ficava guicho, isto é, saudável, com energia. Assim se falava na nossa terra. Guicho ou guicha eram igualmente palavras de uso agrícola, quintaleiro, serviam, por exemplo, para qualificar uma planta recentemente transplantada e que já se apresentava viçosa, vivaz, levantada. Sim, guicho podia ser, ainda, isso: direito, erecto, teso.
(Publicado originalmente no meu blogue Mistérios de Fafe.)
(Publicado originalmente no meu blogue Mistérios de Fafe.)
segunda-feira, 23 de dezembro de 2024
Papando uns e outros
Chegava o Natal e ele, entre bombons e bumbuns, levava tudo a eito e sem destrinça. Padecia de uma espécie muito avançada de paronímia, segundo atestado médico, e a mulher, que era das antigas, desculpava-o, coitadinha...
segunda-feira, 21 de novembro de 2022
E se o olá for outra vez um beijo?
Dizem-me que as palavras já não valem nada. Mentira. As palavras são cada vez mais poderosas, as palavras dominam as nossas vidas. As palavras até tomaram o lugar dos afectos, dos carinhos. Reparem. Antigamente davam-se beijos, davam-se abraços. Agora dizem-se beijos, dizem-se abraços. O gesto ancestral e puro foi substituído pela retórica etiquetada, o contacto físico acabou vergado ao esboço da intenção - à simulação. À dissimulação?
Dizemos "Beijinhos", dizemos "Abraço", dizemos olá de boca, e assim ficamos. Pelas palavras. Beijos e abraços são só vocábulos. Mantemos uma distância alegadamente higiénica entre nós, os alegados amigos uns dos outros. Dizemos. Ao telefone, por escrito, ao vivo na pressa da rua, na patetice dos emojis. Dar a sério (à séria, se lido em Lisboa) é que não. Ninguém dá nada a ninguém - nem sequer beijos, nem sequer abraços. Fazemos votos de. "O que lhe estimo é um beijo", "Desejo-lhe um excelente abraço"...
É. Olhem bem à volta: as palavras estão em alta, navegam de vento em popa. As palavras. O que verdadeiramente está em crise é a palavra, a palavra singular e definitiva, essa vaga memória de uma honra démodée que se arrasta pelas ruas da amargura - abandonada, pobre, cega e nua. Mas isto, claro, sou eu a dizer e são apenas... palavras, palavras, palavras.
Dizemos "Beijinhos", dizemos "Abraço", dizemos olá de boca, e assim ficamos. Pelas palavras. Beijos e abraços são só vocábulos. Mantemos uma distância alegadamente higiénica entre nós, os alegados amigos uns dos outros. Dizemos. Ao telefone, por escrito, ao vivo na pressa da rua, na patetice dos emojis. Dar a sério (à séria, se lido em Lisboa) é que não. Ninguém dá nada a ninguém - nem sequer beijos, nem sequer abraços. Fazemos votos de. "O que lhe estimo é um beijo", "Desejo-lhe um excelente abraço"...
É. Olhem bem à volta: as palavras estão em alta, navegam de vento em popa. As palavras. O que verdadeiramente está em crise é a palavra, a palavra singular e definitiva, essa vaga memória de uma honra démodée que se arrasta pelas ruas da amargura - abandonada, pobre, cega e nua. Mas isto, claro, sou eu a dizer e são apenas... palavras, palavras, palavras.
P.S. - Hoje é Dia Mundial do Olá, ou provavelmente do Oi, após acordo ortográfico.
terça-feira, 6 de agosto de 2019
Albano Martins 3
Palavras
Nenhum ramo
é seguro. Frágeis
são as palavras.
Albano Martins
(Albano Martins nasceu no dia 6 de Agosto de 1930. Morreu em 2018.)
Nenhum ramo
é seguro. Frágeis
são as palavras.
Albano Martins
(Albano Martins nasceu no dia 6 de Agosto de 1930. Morreu em 2018.)
sábado, 16 de fevereiro de 2019
Luísa Dacosta 5
Palavras
Tocam-me
como lábios,
como beijos.
Pássaros, sedentos de ramos
e de sombra,
pousam-me nos ombros
A movimentos de asa,
desenham-me ainda um corpo
- secreta arquitectura de água,
rasgada no vento.
Luísa Dacosta
(Luísa Dacosta nasceu no dia 16 de Fevereiro de 1927. Morreu em 2015.)
Tocam-me
como lábios,
como beijos.
Pássaros, sedentos de ramos
e de sombra,
pousam-me nos ombros
A movimentos de asa,
desenham-me ainda um corpo
- secreta arquitectura de água,
rasgada no vento.
Luísa Dacosta
(Luísa Dacosta nasceu no dia 16 de Fevereiro de 1927. Morreu em 2015.)
domingo, 16 de dezembro de 2018
Olavo Bilac 6
Palavras
As palavras do amor expiram como os versos,
Com que adoço a amargura e embalo o pensamento:
Vagos clarões, vapor de perfumes dispersos,
Vidas que não têm vida, existências que invento;
Com que adoço a amargura e embalo o pensamento:
Vagos clarões, vapor de perfumes dispersos,
Vidas que não têm vida, existências que invento;
Esplendor cedo morto, ânsia breve, universos
De pó, que o sopro espalha ao torvelim do vento,
Raios de sol, no oceano entre as águas imersos
- As palavras da fé vivem num só momento...
De pó, que o sopro espalha ao torvelim do vento,
Raios de sol, no oceano entre as águas imersos
- As palavras da fé vivem num só momento...
Mas as palavras más, as do ódio e do despeito,
O "não!" que desengana, o "nunca!" que alucina,
E as do aleive, em baldões, e as da mofa, em risadas,
O "não!" que desengana, o "nunca!" que alucina,
E as do aleive, em baldões, e as da mofa, em risadas,
Abrasam-nos o ouvido e entram-nos pelo peito:
Ficam no coração, numa inércia assassina,
Imóveis e imortais, como pedras geladas.
Ficam no coração, numa inércia assassina,
Imóveis e imortais, como pedras geladas.
Olavo Bilac
(Olavo Bilac nasceu no dia 16 de Dezembro de 1865. Morreu em 1918.)
quinta-feira, 19 de setembro de 2013
Palavras, palavras, palavras
Dizem-me que as palavras já não valem nada. Mentira. As palavras são cada vez mais poderosas, dominam as nossas vidas. As palavras até tomaram o lugar dos afectos, dos carinhos. Reparem: antigamente davam-se beijos, davam-se abraços; agora dizem-se beijos, dizem-se abraços. O gesto ancestral e puro foi substituído pela retórica etiquetada, o contacto físico acabou vergado ao esboço da intenção - à simulação. À dissimulação?
Dizemos "Beijinhos", dizemos "Abraço", e assim ficamos. Pelas palavras. Beijos e abraços são só vocábulos. Mantemos uma distância alegadamente higiénica entre nós, os alegados amigos uns dos outros. Dizemos. Ao telefone, por escrito, ao vivo na pressa da rua. Dar é que não. Ninguém dá nada a ninguém - nem sequer beijos, nem sequer abraços. Fazemos votos de. "O que lhe estimo é um beijo", "Desejo-lhe um excelente abraço".
É. Olhem bem à volta: as palavras estão em alta, navegam de vento em popa. As palavras. O que verdadeiramente está em crise é a palavra, a palavra singular e definitiva, essa vaga memória de uma honra démodée que se arrasta pelas ruas da amargura - abandonada, pobre, cega e nua. Mas isto, claro, sou eu a dizer e são apenas... palavras, palavras, palavras.
Dizemos "Beijinhos", dizemos "Abraço", e assim ficamos. Pelas palavras. Beijos e abraços são só vocábulos. Mantemos uma distância alegadamente higiénica entre nós, os alegados amigos uns dos outros. Dizemos. Ao telefone, por escrito, ao vivo na pressa da rua. Dar é que não. Ninguém dá nada a ninguém - nem sequer beijos, nem sequer abraços. Fazemos votos de. "O que lhe estimo é um beijo", "Desejo-lhe um excelente abraço".
É. Olhem bem à volta: as palavras estão em alta, navegam de vento em popa. As palavras. O que verdadeiramente está em crise é a palavra, a palavra singular e definitiva, essa vaga memória de uma honra démodée que se arrasta pelas ruas da amargura - abandonada, pobre, cega e nua. Mas isto, claro, sou eu a dizer e são apenas... palavras, palavras, palavras.
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