quarta-feira, 28 de agosto de 2024

Com tomates até às orelhas

Foto Tripadvisor

Corria mais ou menos o insuspeito ano de 2018 quando, de repente, o tomate pelado Guloso, como quem diz o tomate nudista, começou a aparecer-me cá em casa vestido, isto é, com pele. Seria pudor? Frio? Questão de moda? Censura? A merda do wokismo? Fiquei com a pulga atrás da orelha. Farto de ser levado na conversa, aproveitei a última década para passar de bovino come e cala a guerrilheiro da reclamação, e não me tenho dado mal. Dei-me até muito bem por exemplo num gramático protesto a propósito de uma alheira de caça à qual faltava a cedilha, como já aqui contei.
Portanto, o que é que eu fiz? Resolvi contactar o Sr. Guloso ele próprio, perguntando-lhe, preocupado e mais respeitosamente era impossível, se por acaso não estaria o Excelentíssimo passando por alguma crise de escrotal decoro (há que chamar as coisas, neste caso os coisos, pelo nome), e aproveitei para me queixar do cada vez maior verdor e da cada vez maior acidez do produto em questão. O tomate pelado, não esqueçamos.
O meu e-mail teve resposta em quinze dias. Uma resposta profissional, simpática e, pareceu-me descortiná-la, com uma pitada de ironia no estrugido, que foi o que melhor me soube. Fui informado de que os tomates de que eu reclamava tinham sido produzidos "na campanha de 2017, que, por condições extremas do tempo (chuvas em final de Abril e Maio), se traduziu em tomate mais ácido, com menos cor e que se separa da pele com mais dificuldade."
Como forma de "atenuar a imagem menos positiva" que em mim lamentavelmente provocara, o Sr. Guloso revelou a intenção de enviar-me "um cabaz de produtos da marca, incluindo pelado da campanha de 2018, na expetativa de" me "fazer chegar um tomate pelado mais condizente com o nome". E cá está a piadinha...
Obviamente agradeci e recusei a generosa oferta, hábito antigo do velho ofício.
Agora. Estamos no ano de 2024. O tomate pelado Guloso continua a chegar-me a casa com pele, verde e ácido, rigorosamente como o da famigerada e defeituosa colheita de 2017. Conclusão, das duas uma: em Portugal os anos são todos de "condições extremas do tempo (chuvas em final de Abril e Maio)", pelo menos para os tomates, ou então há meia dúzia de anos que todos os anos são 2017. O que seria extraordinário, embora eu já tenha visto algo do género num filme.
Por outro lado, fui ao calendário e descobri o uso que hei-de dar ao monte de embalagens de tomate pelado Guloso que realmente não o é e que acumulei na despensa por não me servirem para nada na cozinha. Hoje é Dia da Tomatina, ou Dia de La Tomatina, na cidade valenciana de Buñol. Estou a caminho, hermanos míos, com tomates até às orelhas. E olé!

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