"Dever dinheiro a alguém é um factor de risco para a saúde mental", disse uma vez ao Diário de Notícias o psiquiatra Miguel Xavier, director do Programa Nacional para a Saúde Mental . O "c" em "fator" é da minha lavra. E compreendo, dentro do possível, o que o senhor professor doutor quer dizer.
No segundo semestre de 2018 passei por uma crise gravíssima. E nunca me tinha acontecido semelhante. De repente vi-me atolado em dívidas. Num dia fiquei a dever doze cêntimos na padaria e no dia seguinte fiquei a dever cinquenta cêntimos na peixaria. Ainda por cima devia também dois euros (um mais um) à latinha do Euromilhões no armário da cozinha, que é para o bacalhau do Natal. O meu nome na praça andava pelas ruas da amargura. Estava desgraçado e não sabia o que havia de fazer à minha vida.
Felizmente Deus é grande, tarda mas não falha, escreve direito por linhas tortas, está em toda a parte, tudo vê e tudo ouve, ouviu-me, olhou para mim, por mim, deu-me a mão, a mão do meu Senhor da Galileia, consegui recompor-me e tenho agora uma vida risonhamente desafogada. Só no passado fim-de-semana achei dinheiro três vezes: dois cêntimos na sexta-feira, dois cêntimos no sábado e um cêntimo no domingo. Evidentemente também me saiu o Euromilhões: quatro euros e noventa e oito. Vou dar um carro novo à minha mulher.
Joe Berardo também dá razão ao psiquiatra Miguel Xavier, director do Programa Nacional para a Saúde Mental, que diz que "dever dinheiro a alguém é um factor de risco para a saúde mental". Olhemos para Joe Berardo exactamente. Berardo fez-se milionário sob o alto patrocínio da Caixa Geral de Depósitos. Sei disto porque ele próprio me contou. A sua primeira poupança foi uma conta que a mãe lhe abriu na Caixa, em 1962, na Madeira, com dois mil escudos (dez euros), teria ele então 18 anos. Uma semente. Uma conta que se manteve aberta e que nunca parou de crescer. Um casamento frutuoso, posto que de conveniência. O saldo de Berardo na Caixa já ia aqui atrasado em mais de 280 milhões de euros - mas de dívida. Joe Berardo devia ao banco público mais de 280 milhões de euros, que se soubesse até àquele então, na sequência de empréstimos manhosos que lhe deram de mão beijada e que ele agora não consegue ou não lhe apetece pagar. À banca portuguesa em geral, o comendador Berardo deve quase mil milhões de euros. Realmente uma fortuna de que eu não faço ideia. E tudo começou com apenas dois contos. Parece ilusionismo, número de circo. É por isso que ele se ri tanto e faz pouco do País. Ele é o homem que conseguiu dar o golpe do baú à Caixa.
Por outro lado, dou valor ao Berardo. Ele deve aqueles camiões, navios e aviões todos cheios de dinheiro - só assim é que me oriento -, ri-se olimpicamente e é um homem rico. Eu não devo um cêntimo a ninguém, ando zangado com a boa disposição e sou um homem pobre - decerto ando doudo! Bem pregava frei Tomás: calotai, meus irmãos, calotai a bom calotar, e sereis felizes para sempre...
P.S. - Hoje, 10 de Outubro, é Dia Mundial da Saúde Mental. Santinho!...
sexta-feira, 9 de outubro de 2020
Joe Bernardo, eu e... a saúde mental
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