sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Dá Deus dentes

A pé, ó vítimas da fome!
- A pé, ó vítimas da fome! - gritou o speaker-cantor. O pavilhão estava cheio mas ninguém se levantou. Era uma fraqueza muito grande...
 
Honrando a dieta mediterrânica
Assinala-se hoje o sétimo aniversário da elevação da dieta mediterrânica a Património Imaterial da Humanidade. Quer-se dizer: se hoje fosse dia 4 de Dezembro de 2020 o assinalamento seria porventura mais exacto, mas aqui o que interessa é a intenção: portanto é hoje.
O que eu gosto mais na dieta mediterrânica, para além da comida propriamente dita, é o facto de se chamar dieta, o que me sossega sobremaneira a consciência, embora me alvoroce os intestinos. Uma dieta feita, paradigmaticamente, à base dos ossinhos da suã da Tasquinha da Alice, em Bobal, Mondim de Basto, como quem vai para as Fisgas de Ermelo, entalados, os ossinhos, entre salpicão caseiro e moiras encantadas e um naco de orelheira para desenfastiar e duas ou três costelinhas e meia dúzia de fatias de toucinho com o sal no ponto e batatas sabendo a terra e olhos de couves geadas pela madrugada e feijão vermelho da leira ao lado e por cima alho picado e azeite da fartura e do melhor mais um tintinho honesto e de malga para molhar a palavra. Produtos frescos, locais e produzidos em sintonia com os ciclos astrais e os ritmos da natureza, como muito bem preconiza a UNESCO. E eu respeito implacavelmente a UNESCO.

 
Assim e assado
- Há dias assim.
- E dias assado?
- Assado, não. Só aos domingos. 


Tomai e comei todos (o que é um bocado relativo)
Então, depois de dar graças a Deus, o pai tomou o pão, partiu-o e distribuiu-o por metade dos seus filhos, dizendo: Laide, Ruca, ide comer a casa da avó, que a broa não chega para todos.
 
Eu quero uma república das bananas. E do pão.
A questão foi pertinentemente colocada numa reportagem televisiva, aqui há coisa de oito anos, portanto no tempo do Passos e do Cavaco. Que República queremos ter? Se me perguntassem a mim - mas a mim só me perguntam o caminho para o IKEA de Matosinhos -, eu tinha a resposta na ponta da língua: quero uma república das bananas. E das maçãs e dos pêssegos, do pão e do carapau, do frango de aviário e do leite, da massa de cotovelo e da água. Uma república republicana, com comida na mesa, até na mesa dos trabalhadores. E com trabalho para os trabalhadores. E com gente séria no Governo. E com um presidente que seja da República e deste mundo (como parece que temos agora...).
É decerto por ter estas ideias malucas que ninguém me pergunta nada, a não ser o caminho para o IKEA de Matosinhos. É. Só os galegos desorientados é que querem saber a minha opinião...  


Quem dá o pão...
Amadeu, amatirou. Pois é: quem dá o pão, também dá a criação.
 
Vendemos para fora
Intrigado com a novidade estrangeira que de repente tomou conta das portas, janelas e montras dos restaurantes da cidade, entrou na velha casa de pasto, sem vez, sem distância e sem máscara, porque "era só para fazer um pergunta", e perguntou:
- Aquilo do Take away é o quê?
- Quer dizer que vendemos para fora.
- Há mais de trinta anos que todos os sábados venho aqui buscar um tachinho de tripas. Qual é a diferença agora?
- O coronavírus...

 
Em lata
A quarentena fez dele um verdadeiro especialista em atum. Bom Petisco à segunda, Ramirez à terça, Tenório à quarta, Minerva à quinta, Pitéu à sexta e Inês ao sábado. Ao domingo, sardinha em tomate, evidentemente. 
 
Honestidade a toda a prova
Era um chef de uma franqueza que só vista. Tinha um aclamado programa televisivo, e não raras vezes, após confeccionar e provar os seus requintados pratos de assinatura, sentenciava, de colher a meia haste, olhos revirados e boca em biquinho de deleite e aprovação: - Hummm! Que merda!...
 
Frigorífico (ou Olhai os lírios do campo)
De boas intenções está o frigorífico cheio. Depois, evidentemente, é preciso saber cozinhar.
 
Comer com os olhos
Eram dois homens, já na segunda metade da idade. Um deles fica à porta, enquanto o outro entra no restaurante. O proprietário, que o recebe no hall, pergunta-lhe "É para almoçar?" e o homem responde "É para dar uma vista de olhos". O dono do estabelecimento, embora lhe apeteça, não disparata: "Faça favor. Isto não é nenhum museu, mas não paga nada".
Um ou dois minutos depois, o homem sai. Olha para o amigo que o espera, não falam, e desandam dali no mesmo passo descomprometido com que tinham chegado. Deixo de os ver. Fico a imaginar que vão a outro restaurante, fazem a mesma cena mas trocam de papéis. Assim, à vez, vão comendo com os olhos e já ficam almoçados. Melhor do que ir mastigar o papo seco de nariz amarrotado contra a montra do talho.
Em Belém e São Bento se calhar não sabem. Comer com a boca está a sair dos hábitos de cada vez mais portugueses. 


Espanto gastrointestinal
Era vegetariano e cagava postas de pescada. A ciência nunca soube explicar o fenómeno. 

Saia mais um galo
Freguês assíduo das bifanas da Conga e produtos correlativos nomeadamente codornizes, tinha uma filosofia de vida a que nunca se exima, por mais adversas que fossem as condições. E essa filosofia essencial era - Mais vale um pássaro no prato do que duas mãos a voar. E mais dois fininhos, se faz favor.

Pão, pão, queijo, queijo
Chegou e pôs tudo em pratos limpos. Aquela cozinha metia nojo... 

Os mórreres
Sim, os víveres, evidentemente os víveres. E os mórreres?...

O tempo
- Para a semana eles dão chuva.
- E que se coma, nada?...
 
Prato do dia
O reclame impresso sem erros em papel A4 e colado na portinha de vidro do minúsculo restaurante dizia em letras garrafais "Prato do Dia - 3,50 euros". E em letras pequeninas esclarecia "Só prato". Manobras publicitárias à parte, prato com comida era realmente uma bocadinho mais caro...
 
P.S. - Hoje, 16 de Outubro, é Dia Mundial do Pão, Dia Mundial da Alimentação e, já agora, Dia Mundial da Coluna, que não vem ao caso.

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