Mostrar mensagens com a etiqueta obesidade. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta obesidade. Mostrar todas as mensagens

sexta-feira, 27 de junho de 2025

Do Costa Pacifica ao Costa do Assento

Reservado o direito de admissão
Foi má ideia aquele letreiro à porta do consultório - "Proibida a entrada de animais". Era um veterinário... 

Moro mesmo em frente ao mar, se for para a varanda e me puser de lado. A minha rua é o oceano. No meu quintal estacionam regularmente navios de passeio mediterranicamente atlânticos, paquetes carregados, descarregados e outra vez carregados de turistas rotundos e supersónicos que conseguem turistar o Norte de Portugal inteiro em menos de oito horas. Há quem chame ao meu quintal, por inveja ou ignorância, Terminal de Cruzeiros do Porto de Leixões. Mas não: é o meu quintal e mais nada.Noutro dia parou ali em baixo o Costa Pacifica, um colosso. São quase trezentos metros de navio para 3.780 passageiros. E sabeis que mais? Eu vim de Fafe, uma terra evidentemente sem comparação, ainda para mais agora que também tem mar, basta ir à Barragem, qualquer dia começam a aparecer aí os navios, e, Costa por Costa, estávamos melhor servidos, tínhamos o Costa do Assento, que tocava concertina, uma vez deu na televisão a apoiar o General Ramalho Eanes e também era uma categoria de pessoa, não desfazendo. O Sr. Costa tinha tudo de bom, tirante o feitio: foi meu vizinho, bombeiro valente e lavrador de primeira apanha, "veterinário" autodidacta, espécie de curandeiro, endireita e parteiro dedicado em exclusividade ao gado sobretudo vacum, tocava e mandava no rancho folclórico, ensinava viras, malhões e jogo do pau, era casado com a boa Senhora Rosinda e pai do Zé e do Lando, jóias de moços que lhe herdaram as artes, e pegava assiduamente no andor da Senhora de Antime.
Chegam, os turistas, e afigura-se-me que vieram para um congresso de cus na Exponor. Vê-los logo pela manhã é um espectáculo que não pára de maravilhar-me. Porque, conforme eles vão saindo, o barco vai subindo, fica mais alto, airoso, aliviado, parece-me. Depois, à tarde, regressam, os turistas, embarcam de requitó, pós-doutorados em sardinha assada e vinho do Porto, vão entrando e o barco começa a dar de si, amoucha, encolhe-se, queixa-se, parece-me, larga dois ou três lamentosos arrotos, zarpa devagar, devagarinho e não percebo como é que não se afunda.
Naquele tempo, nos tempos áureos do Costa do Assento, turistas éramos nós, os putos de Fafe, lingrinhas de pé descalço e pila ao léu, em sorrateiras escapadelas até às recônditas estâncias balneares do Poço da Moçarada, do Comporte ou de Calvelos, de onde, por norma e tradição, éramos sacados a ganir, puxados por uma orelha. A minha mãe parecia que tinha radar, e, uma desgraça nunca vem só, sabia sempre por onde é que eu andava e o que fazia. Que se segue? Os paquetes que agora me batem regularmente à porta chegaram tarde à minha vida, eu preferia tê-los visto atracar à poça do Santo ou à ponte do rio de Pardelhas, mas mais vale tarde que nunca, e mesmo agora dão-me bastante que pensar, suscitam-me reflexões de pequena e média profundidade que, não raro, gosto de partilhar. E daquela vez, olhando para o imponente Costa Pacifica, vieram-me à cabeça os cus. Os cus que os cruzeiros descarregam e recarregam.
Cu de turista não é brincadeira. É traseiro de bitola larga e se for cu americano então ocupa o mundo inteiro ou ameaça ocupar. Até parece que para se ser turista - turista diplomado - é preciso ter um cu daqueles. E o cu alemão e o próprio cu inglês também para lá caminham, não querem ficar atrás. O que diz tudo a respeito dos cus. Imagino que sejam muito ricos os camones com que me cruzo nas bordas do Porto de Leixões. Tão turistas e tão prendados de cu, serão decerto milionários. Engordam e viajam porque podem. E podem muito. Os cus precisam de arejar.
Na minha rua passa o mar. E, afinal, é porreiro ver navios. Por causa do Costa Pacifica, lembrei-me do Costa do Assento. Se quereis saber, ganhei o dia.

P.S. - Versão corrigida e (bastante) aumentada, publicada no meu blogue Mistérios de Fafe.

sábado, 24 de maio de 2025

Ao contrário

Conheço uma senhora que todas as manhãs faz exercício ali em baixo no Passeio Atlântico, à beira do mar. Entre outras habilidades atléticas, a senhora sobretudo caminha de costas, arrecua, ou seja, anda ao contrário. E isto há anos. Resultado: em vez de emagrecer, a senhora está cada vez mais gorda...

P.S. - Hoje é Dia Nacional de Luta Contra a Obesidade.

terça-feira, 4 de março de 2025

Um dia com os dias contados

Hoje é Dia do Gordo e é um dia com os dias contados. Porque hoje em dia não se pode dizer gordo de ninguém. Nem obeso, porque obeso quer dizer gordo e gordo não se diz, que agora é proibido. A palavra gordo, aliás, está a ser tirada dos livros e até das letras das cantigas e dos iogurtes, da manteiga, do queijo, das natas e do leite. Meio gordo e gordo. E quem não diz gordo, não diz forte, cheio, pesado, corpulento, encorpado, robusto, parrudo, nutrido, fornido, gorducho, balofo, anafado, roliço, redondo, rechonchudo, arredondado, barrigudo, banhudo, gordalhão, gordalhaço, gordalhufo, rolho, rotundo, cevado, adiposo, inchado, repolhudo, trambolho, amatronado, grande, volumoso, farto, grosso, graúdo, avantajado, vultoso, avultado, alentado, abundante, generoso, considerável, rico, polpudo, enorme, imenso, vasto, excessivo, copioso, profuso, basto, lauto, gorduroso, gordurento, oleoso, engordurado, besuntado, untuoso, gordureiro, sebento, graxento, graxo, fértil, fecundo, produtivo, rico, humoso, úbere e uberoso, são palavras que vão ser apagadas como se nunca tivessem existido, porque, lá está, vai tudo dar ao gordo. E gordo foi cancelado. Diremos então, como deve ser, "indivíduo ou indivídua ou indivídue denotando cubicagem corporal talvez digna de registo". Isto é, para abreviar, gordo ou gorda ou gorde.

P.S. - Publicado originalmente no Dia do Gordo, celebrado a 10 de Setembro. Hoje é Dia Mundial da Obesidade.

É fartar, vilanagem!..

Hoje é Dia Mundial da Obesidade. Repare o estimado leitor que é, repito, Dia Mundial da Obesidade e não Dia Mundial Contra a Obesidade. Portanto, olhe, faça como eu, aproveite enquanto pode, e hoje possa muito, porque também é dia do monumental cozido à portuguesa, ou pelo menos à moda de Fafe, que ainda é maior!
Aliás, o Dia Mundial da Obesidade está obviamente condenado, por indecente e má figura. Para o ano decerto já não há. Porque a obesidade é do obeso e o obeso é gordo, e isso são palavras que hoje em dia não se dizem. Já nem nos livros. Nem nos filmes. Evidentemente.

P.S. - Hoje é Dia Mundial da Obesidade.

domingo, 20 de outubro de 2024

Estatisticamente saciados

Cada português come, em média, cerca de 15 quilos de bacalhau por ano, segundo dados avançados pelo Norwegian Seafood Council e repetidos aqui atrasado na imprensa nacional. É a beleza e a fartura das estatísticas: todos nós comemos bacalhau, mesmo os que não gostam de bacalhau, mesmo os que não comem bacalhau e mesmo os que, derivado à pobreza e à fome, não comem coisa nenhuma. Todos comemos, queiramos ou não, possamos ou não, comamos ou não, e pela medida grande. Quinze quilos para cada um, não fazemos a coisa por menos...

P.S. - Hoje é Dia Mundial da Estatística.

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Os gordos de Lisboa

Três em cada dez lisboetas são obesos. Apontada como a epidemia da século XXI, a obesidade afecta 32 por cento dos habitantes da capital, enquanto 37 por cento estão em situação de pré-obesidade. Os números fazem parte de um estudo realizado no âmbito do programa Saúde Mais Próxima.
Conclusão: os lisboetas querem ser turistas. Enquanto não têm dinheiro, vão ganhando cu. E já não lhes falta tudo.
Hoje também se soube que os albergues nocturnos do Porto estão lotados e são procurados por cada vez mais pessoas que precisam de matar a fome. Claro que estas duas notícias não são propriamente o contraponto jornalístico ou o contraditório político uma da outra - mas que há aqui carradas de ironia, ai isso há.

domingo, 4 de novembro de 2012

Elogio ao génio humano

Foto Hernâni Von Doellinger

Ontem estacionou-me ali em baixo o Arcadia. São 285 metros de navio para 1.948 passageiros. Os cruzeiros que me batem à porta têm-me dado que pensar, suscitam-me reflexões de pequena e média profundidade que aqui humildemente partilho com os meus queridos leitores. E ontem vieram-me à cabeça os cus. Os cus que os cruzeiros descarregam.
Cu de turista não é brincadeira, já repararam? É cu de bitola larga e se for cu americano então ocupa o mundo inteiro. Menos a Alemanha. Até parece que para se ser turista - turista encartado - é preciso ter um cu daqueles. E o cu alemão também para lá caminha, não quer ficar atrás. O que diz tudo a respeito de um cu.
Imagino que sejam muito ricos os camones com que me cruzo nas bordas do Porto de Leixões - eles a saírem todos cheios de good morning e eu, de passagem, "desculpem lá a shit de dog na sola da sandália, é good luck, com os cumprimentos do mayor". Tão turistas e tão prendados de cu, têm que ser muito ricos. Engordam e viajam porque podem. Se calhar até têm ordenados, subsídios e reformas.
Chegam e parece-me sempre um congresso de cus. Toneladas e toneladas de bagagem extra em traseiros colossais e gingões mesmo à frente do meu nariz. Confesso: é um espectáculo que não pára de maravilhar-me. Olho para os cus e olho para o barco, e só me apetece elogiar o génio humano, os avanços da ciência, os milagres da indústria, a arte e o engenho dos modernos fazedores de navios, supremos desafiadores das leis da física. Fascina-me aquilo que não consigo compreender. Para os cus e para o barco, olho e penso: com tanto badocha ali metido, como é que aquela merda se aguenta?