domingo, 16 de janeiro de 2022

O segredo não está no picante

Numa das suas visitas oficiais ao Porto e Norte de Portugal, o saudoso Anthony Bourdain (1956-2018) andou pela Invicta, deu um salto aos vales do Douro e do Tâmega, comeu umas especialidades de carregar pela boca e teve o duvidoso privilégio e manifesto incómodo de assistir a uma matança de porco e às litúrgicas operações de desmancho e salga, acabando o dia a jogar à bola com a bexiga do bicho, como mandava a tradição.
E depois foi-se embora. Atenção: foi-se embora sem antes ir à Conga comer uma bifana. Mas, desta ou doutra vez, comeu bifanas em Lisboa. Isto cabe na cabeça de alguém? As bifanas da capital sempre me mereceram as maiores reservas e, francamente, a equipa do No Reservations deveria estar na posse desta importante informação.
Bourdain disse que gostou muito das lisboetas "sanduíches gordurosas de porco", com carne "imunda e cortada em fatias finas". É uma definição elegante e que se aceita. Mas havia de ter provado as do Porto, na Rua do Bonjardim! E não me venham dizer que as bifanas são iguais em todo o lado. Porque não são. E não me venham dizer que é tudo uma questão de picante - mais ou menos. Porque não é. E não me venham dizer que é só temperar com vinho branco e mais não sei quê (o resto fica cá comigo, que também as faço uma categoria). Porque não é. É com o vinho (e com o resto), mas também com cerveja, ou para onde é que vocês cuidam que vão as sobras dos barris e a espuma que esborda dos finos (ou imperiais) mal tirados? Vai tudo lá para dentro, para o caldeirão da molhanga, e aqui é que bate o ponto. Aqui é que a porca torce o rabo. É que as bifanas do Porto chafurdam em Super Bock. E isso faz toda a diferença.

P.S. - Hoje, 16 de Janeiro, é Dia Internacional da Comida Picante.

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