Foto GASPAR DE JESUS |
No tempo em que os animais falavam
Houve um tempo em que os presidentes dos maiores clubes de futebol falavam com os jornalistas e até convidavam os directores dos jornais para jantar. Todos eram tratados por igual e quem tivesse unhas que tocasse viola. Mas isso foi muito, muito antigamente, no tempo em que os animais falavam e não havia telemóveis. Depois, conta-se que os presidentes dos maiores clubes resolveram dividir os jornalistas em dois grandes grupos: os que levavam recados e os que levavam pancada - e deixaram de falar aos restantes. Mais tarde, os presidentes dos maiores clubes criaram as suas próprias televisões e passaram a ser "entrevistados" pelos seus próprios jornalistas. E agora, quando se dignam descer até ao ecrã das televisões generalistas, exigem tratamento de primeiro-ministro. São outros tempos...
Gosto muito de todavias
Na rádio ouvi aqui uma pequena entrevista telefónica feita ao presidente de um clube de futebol da primeira divisão. Claro que o entrevistado não era nenhum dos três cabeçudos - esses não têm telefone (por causa da polícia), só dão "grandes entrevistas" nas televisões mais ou menos nacionais, em directo e exclusivo, ou, quando lhes apetece, mandam recado pela rapaziada que mantêm nas redacções. E também não era nenhum daqueles que querem ser cabeçudos quando forem grandes. Era somente o presidente de um clube de futebol de passagem pela primeira divisão.
E querem saber? Gostei do que ouvi. Em apenas três ou quatro frases telegráficas, num discurso simples e honesto, o presidente utilizou pelo menos duas vezes a conjunção adversativa (ainda se chamará assim?...) todavia. Ora, eu gosto muito de todavias. O facto de haver um presidente de um clube de futebol da primeira divisão que respeita o trabalho dos jornalistas e tem educação bastante para atender o telemóvel e permitir a gravação de uma conversa, nos dias que correm e por si só, é para mim uma enorme novidade, um motivo de justificado aplauso. E ainda por cima as todavias falaram-me ao coração. Este presidente, digo já, passou a merecer a minha mais sincera admiração.
Apesar de nenhuma das suas todavias estar devidamente contextualizada. Ou, como se diz agora à la française, "mesmo que" nenhuma das suas todavias estivesse devidamente contextualizada. Atirou-as ao calhas e quem quiser que fuja. Quero lá saber: o homem é do futebol, não é gramático. Podia ter dito "picaretas" e, isso sim, seria perigoso. Gosto muito de todavias, mas as todavias não são tudo...
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