O grito de minha mãe vinha de lá de dentro, imperioso:
- Vai ficar a vida inteira no banheiro?!... Olhe o colégio!... Você precisa ficar pronto para o colégio!... São quase oito horas!... Olhe o colégio!... O colégio!... COLÉGIO!... CO-LÉ-GIO!...
Deus meu, como uma palavra podia tanto encher uma manhã que fora era tão bonita! Diabo de tanto colégio! Besteira a gente sentar a bunda num banco de madeira e passar a vida inteira ouvindo sobre Matemática, Religião, Geografia... Não, Geografia, não. Como era bom saber o nome de tudo, dos rios, dos países. Quando vinha minha caderneta de nota os comentários sempre apareciam da mesma forma: Geografia é matéria de vadio, vagabundo...
Colégio!...
E quando iria acabar aquela angústia toda? Breve faria quatorze anos e depois que operara a garganta até que parecia mais. E por parecer mais é que me demorava fascinado decorando o meu rosto no espelho. Espinha não queria dizer nada, porque com o tempo passava. Duro era o nariz. Nariz de batatinha roxa, nojento. Nojento, pois que meus olhos pequenos, meu cabelo ondulado, meu pescoço que ficara forte e o jeito que meu peito tomava por causa da natação praticada às escondidas no Rio Potengi. Mas o nariz... pra que a gente tinha nariz? Meu tio possuía um digno nariz de papagaio, mas era nariz. Depois que eu li o baile de um livro chamado "4 mulheres" e que uma menina colocou um pregador de roupa no nariz para afiná-lo, foi pior. Fiz a mesma coisa e, em vez do nariz de batata, fiquei com um pimentão. Nem olhava para o povo de casa com vergonha, durante as refeições.
Colégio!...
Pronto. Vestia a farda, pegava os livros.
"Doidão", José Mauro de Vasconcelos
(José Mauro de Vasconcelos nasceu no dia 26 de Fevereiro de 1920. Morreu em 1980.)
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