O sol caindo sob a Cidade Nova, deitava os raios oblíquos, e as
casas altas sobre a estreiteza da rua banhavam-na em sombra amena,
bruscamente cortada, nas esquinas das ruas transversais, com uma mancha
dura de claridade. As bandeiras, permanentes nas sacadas dos prédios,
ondulavam com a viração agradável que soprava do mar, e no movimento
daquelas fraldas largas dos pavilhões desbotados, de cores mortas pela
exposição constante à atmosfera, roçando penosamente nos arcos de bicos
de gás de lado a lado na rua, desprendia-se um característico ar de
rudez primitiva, como que prolongando e acentuando o contraste estranho
entre as edificações da rua e as vitrinas, do povo imenso grulhando e o
exíguo espaço da calçada, estrambótica com os esgotos em meio, a mescla
indizível de civilização e barbaria que ressumbra da rua do Ouvidor.
De súbito, a gente toda que acercava a esquina da rua da Quitanda, alvoroçou-se, e uma nuvem densa de poeira levantou-se.
- Que diabo! Exclamou Garcia tapando o nariz com o lenço
e atirando-se para o lado oposto. Isto é um desaforo! Em plena rua do
Ouvidor, a estas horas.
"A Todo Transe!...", Emanuel Guimarães
(Emanuel Guimarães nasceu no dia 12 de Fevereiro de 1871. Morreu em 1907.)
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