domingo, 12 de fevereiro de 2017

Emanuel Guimarães

O sol caindo sob a Cidade Nova, deitava os raios oblíquos, e as casas altas sobre a estreiteza da rua banhavam-na em sombra amena, bruscamente cortada, nas esquinas das ruas transversais, com uma mancha dura de claridade. As bandeiras, permanentes nas sacadas dos prédios, ondulavam com a viração agradável que soprava do mar, e no movimento daquelas fraldas largas dos pavilhões desbotados, de cores mortas pela exposição constante à atmosfera, roçando penosamente nos arcos de bicos de gás de lado a lado na rua, desprendia-se um característico ar de rudez primitiva, como que prolongando e acentuando o contraste estranho entre as edificações da rua e as vitrinas, do povo imenso grulhando e o exíguo espaço da calçada, estrambótica com os esgotos em meio, a mescla indizível de civilização e barbaria que ressumbra da rua do Ouvidor.
De súbito, a gente toda que acercava a esquina da rua da Quitanda, alvoroçou-se, e uma nuvem densa de poeira levantou-se.
- Que diabo! Exclamou Garcia tapando o nariz com o lenço e atirando-se para o lado oposto. Isto é um desaforo! Em plena rua do Ouvidor, a estas horas.

"A Todo Transe!...", Emanuel Guimarães

(Emanuel Guimarães nasceu no dia 12 de Fevereiro de 1871. Morreu em 1907.)

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