Ode ao Cristo das Janelas Verdes
Quem te pintou triste e secreto, 
                                        Ó Cristo de olhar vendado, 
                                        Ó Cristo misterioso, 
                                        Abandonado 
                                        No Museu das Janelas Verdes, 
                                        Quem te pintou saudoso, 
                                        Talvez do Céu, talvez do Homem, 
                                        Talvez da criação antes da prova, 
                                        Quem te pintou assim, sereno e encoberto, 
                                        Imagem nova 
                                        Que um povo a ti votado 
                                        Um dia descobriu? 
                                        Ninguém conhece o mestre que te viu 
                                        Enigmático, silencioso, 
                                        Um Deus, dir-se-ia, envergonhado, 
                                        Mais que humilhado, 
                                        Vexado 
                                        Porque a palavra se cumpriu, 
                                        Porque na hora precisa 
                                        Os seus irmãos eleitos 
                                        O julgaram, 
                                        O feriram, 
                                        O mataram 
                                        E porque ao longo deste tempo interminável, 
                                        Após a crucifixão, 
                                        Após a ressurreição 
                                        O julgamento prossegue, 
                                        A tortura, o crime, 
                                        A traição, 
                                        O deicídio constantemente perpetrado 
                                        Ao sabor da existência quotidiana. 
                                        Ninguém conhece o pintor, o iniciado, 
                                        O sabedor do mistério 
                                        Que é o longo movimento necessário 
                                        Do nosso universo imaginário, 
                                        Onde tudo é signo e símbolo, 
                                        Onde o olhar de Jesus, encoberto, 
                                        Ensina a suprema perfeição 
                                        De um Deus capaz de amar 
                                        E de chorar, 
                                        De um Deus assassinado capaz de ressurgir 
                                        E de voltar 
                                        Sem parábolas, sem cifras, sem véus 
                                        Na plenitude da final revelação.
(...)
António Quadros
(António Quadros nasceu no dia 14 de Julho de 1923. Morreu em 1993.) 
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