domingo, 2 de abril de 2017

Requiem pelas minas do Pejão 5

Foto ADRIANO MIRANDA

Claro que haverá quem esteja bem, quem se possa estabelecer, partir facilmente para outro emprego, quem, pura e simplesmente, se possa dedicar à boa-vida! Mas falamos dos outros, da maioria. O que irá acontecer a toda esta gente, quinhentas pessoas sobretudo entre os 31 e os 45 anos, reconhecidas pela sua "elevadíssima qualidade profissional". Até porque "o Porto era a 'centenas de quilómetros', e aqui tiveram que autonomizar-se, especializar-se, tornarem-se os melhores, cada qual na sua arte". E agora, que será deles? Quantos aguentarão o choque da descida do seu ordenado médio mesal de 150 contos até às profundezas de um salário mínimo abaixo dos 50 contos?
E no entanto - há um certo desconforto na explicação da Comissão de Trabalhadores da ECD - "não houve contestação, não houve manifestações nem greves. E o que é que ganhávamos com elas? Era mais o prejuízo, e isto afinal é mesmo para fechar. Além disso, o que é que queríamos, se ainda nos dão mais dinheiro do que é de lei?..."
Sábia Administração! "Souberam fazê-la, dividiram as pessoas". De facto, apesar dos "critérios técnicos e humanos" utilizados, não será decerto inocente a escolha de todos os elementos da Comissão de Trabalhadores para integrarem o grupo restrito dos que ficam com as tarefas do desmontar da feira - os "trabalhos de desactivação e reposições ambientais", que se prolongarão pelo menos até Junho de 1995...
Outros dos orgulhos da ECD é, com efeito, a (pelo menos aparente) ausência de chagas ambientais irreversíveis. E por isso é que anuncia a reconversão das instalações num "complexo de formação turismo e lazer", com vertentes cultural, desportiva, de acolhimento e convívio. Mas isso será outra história.
Para já, longe dos "tempos áureos" da II Guerra Mundial, quarenta quilómetros de camadas e galerias após, e algumas dezenas de de milhões de toneladas de carvão extraído depois, vai desligar-se a máquina. Dir-se-ia que acaba enfim a vida de condenados das "toupeiras" do Pejão. Mas não, agora é que lhes começa a mais dolorosa carga de trabalhos. Quinhentos novos desempregados, menos 800 mil contos por mês para injectar na região, pobre, deprimida, isolada, longe. A solução passa pela emigração e planta-se o espectro da desertificação. Pedorido, Raiva, Paraíso e Real são as quatro freguesias do concelho de Castelo de Paiva que, às tantas, não conseguirão aguentar a previsível violência do embate. Porque se as pessoas, para já, se podem esconder no engodo do subsídio de desemprego, o que se vislumbra no fim do túnel é a crise, a fome, lá no fundo desses 22 meses de engano assalariado...

P.S. - O fotojornalista Adriano Miranda lança no próximo 1.º de Maio o álbum de fotografia "Carvão de Aço", em homenagem aos mineiros do Pejão. As minas fecharam em 1994. Na ocasião andei por lá e escrevi para a revista Anégia este "Requiem" que hoje termino. Quem se quiser dar ao trabalho, seria de conferir e comparar o que foi então prometido aos trabalhadores despedidos e a Castelo de Paiva com o que entretanto acabou realmente feito...

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