Viva, mas quieta. Muda. Seu silêncio acusa o marido: é culpa tua, Leão. Me trouxeste para este fim de mundo, para este lugar onde não há gente, só animais. De tanto eu olhar para cavalos, meu filho nasceu assim. (Poderia citar exemplos: mulheres que riram de macacos e cujos filhos nasceram peludos; mulheres que olharam para gatos - seus bebês miaram meses.) Ou quem sabe é sobre a estirpe dele que levanta dúvidas: na tua família são todos defeituosos e doentes, tens um tio que nasceu com o beiço rachado, uma prima com seis dedos em cada mão, uma irmã diabética. Enfim: a culpa é tua - poderia bradar, mas não o faz. Não tem forças para tanto.
Além do mais, é seu marido, seu homem. Nunca gostou de nenhum outro; nunca pensou em nenhum outro. O pai lhe dissera: vais casar com o filho do Tartakovsky, é um bom rapaz. Pronto: seu destino fora traçado. Quem era ela para discutir? E mesmo, não lhe desagradava o jovem Leão, era um dos rapazes mais bonitos da aldeia. Forte, alegre, até que ela tivera sorte.
"O Centauro no Jardim", Moacyr Scliar
(Moacyr Scliar nasceu no dia 23 de Março de 1937. Morreu em 2011.)
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