Lendas, contava-as uma categoria a minha avó de Basto. Eram lendas mansas, de embalar, metiam mouras encantadas, príncipes, penedos. Penedos de morar, lembro-me bem e eu queria um. Eram contadas à lareira, depois da ceia, com o vermelho do fogo a bailar-nos nas caras espectrais, eu de olhos arregalados e boca aberta, uma e outra vez, como se fosse sempre a primeira. Os efeitos especiais das lendas da minha avó Emília - pequerrichinha, bondosa, anjo sem asas à vista - foram muitos anos mais tarde copiados pelo cinema americano. Até aquele famoso jogo de sombras manipulado pela irrequieta chama da candeia, coisa extraordinária e assustadora - era das lendas da minha avó. E o vinhinho aquecido ao borralho com uma maçã assada lá dentro também, mas isso parece que os filmes não aproveitaram.
Na manhã seguinte, pela fresca, íamos à lenha ao monte. Eu e e minha avó, maravilhosa guardadora de lendas e tudo. E a bó mostrava-me o penedo, o exacto penedo da moura encantada, não havia dúvidas. Ainda por cima, as lendas da minha avó eram verdade.
(Retirado do texto escrito e publicado no dia 16 de Setembro de 2013, com o título "Ele há lendas e lêndeas".)
Sem comentários:
Enviar um comentário