quinta-feira, 1 de outubro de 2020

Le solfège de l'école

O especialiszt
Era o verdadeiro e definitivo especialiszt. Ouvissem-no tocar a "Sonata em si menor" e perceberiam porquê...

Contos americanos
- Era um exímio executante...
- Tocava o quê?
- Cadeira eléctrica.
 

Eram quatro e formavam um excelente trio
Eram quatro pessoas em palco: um senhor à viola, uma senhora no clarinete, um senhor ao piano e outro senhor virando-lhe as páginas da partitura. Procurei-lhes os nomes enquanto tocavam Brahms e Mozart com assinalável competência. Os quatro formavam o famoso Trio Tomter, Kam & Ihle Hadland. Isto é: são o senhor Lars Anders Tomter, a senhora Sharon Kam e o senhor Christian Ihle Hadland, por ordem de instrumentos. O mudador de páginas, posto que exímio executante, era provavelmente o rapaz, ou o moço, como se diz nas obras em Portugal...

Virando a página
Dele se dizia que passou a vida ao lado de uma grande carreira. Era, com efeito, virador de partituras.  

Órgãos no mercado
Comprar órgãos no mercado, embora possa salvar vidas, é crime, dá dez anos de prisão. Concertinas, vá que não vá...
 
Organista
- Profissão?
- Organista.
- Orquê?...
- Tocador de órgão...
- Próprio ou por conta de outrem?...  
 
Robert Allen Zimmerman
Robert Allen Zimmerman nasceu na cidade americana de Duluth, Minnesota, em 1941, e gostava muito de cantar. Cantava, por exemplo, que os tempos estão a mudar. Mas cantava de uma maneira tão inesperadamente fanhosa que as pessoas começaram a chamar-lhe Bob Dylan. 

E agora o Nobel do velho Dylan em duas notas só. Uma. É um bocado estranho pensar que assisti a um concerto de um Prémio Nobel da Literatura. Um excelentíssimo concerto, à pala do meu irmão Lando, no Coliseu do Porto, na noite de 8 de Abril de 1999. Um concerto de literatura, portanto. Se o próximo laureado for, por exemplo, o Tony Carreira, tenho o mesmo problema, porque também já assisti a um concerto do Tony. O meu irmão, que até é um intelectual, é que não. A outra. Não percebo a surpresa e o espanto que li e ouvi na comunicação social portuguesa a propósito do Nobel atribuído ao poeta Bob Dylan. Há anos que se falava dessa possibilidade, e também de outra no mesmo ramo, Leonard Cohen. No caso de Dylan, o assunto foi muito badalado quando o norte-americano cantou para o papa João Paulo II, no congresso eucarístico de Bolonha, em 1997.

Bravo!, bravo!, bravo!, gritou-se na ópera
O São Carlos rebentando pelas costuras, o público, conhecedor, finíssimo, lisboeta, num delírio de palmas compassadas e gritos comedidos (os chamados gritinhos): - Bravo!, bravo!, bravo!...
O touro, um Miura rondando os 650 quilos, assomou à boca de cena e agradeceu, composto e patriótico: - Gracias, muchas gracias!...

Until the fat lady sings
Já não há na ópera senhoras gordas como havia antigamente. Agora as senhoras da ópera são magras, geralmente bonitas e algumas até boas como o milho. A mim, que sou melómano e purista, faz-me diferença, desconcentra-me.

Música para unhas encravadas
- Isso é música para os meus ouvidos...
- Como é que adivinhou? Com efeito, são as Variações Goldberg, de Bach, tocadas pelo András Schiff...

O chichi do maestro
Nos grandes concertos sinfónicos, o maestro sai sempre no final de cada peça para ir à casinha mudar a água às azeitonas. Depois volta para as palmas e para as vénias, sorridente e aliviado. E os músicos? Os músicos protestam batendo nas estantes e continuam em palco de perninhas apertadas e, quem sabe, a urinarem-se por elas abaixo...  
 
Quarteto de cordas
Eram um excelente quarteto de cordas: de sisal, de propileno, bamba e estática. As quatro acompanhavam regularmente a corda vocal. Quando assim, eram o Quinteto da Corda. 

Sopranos e beltranos
Os sopranos têm, por definição, o tom de voz mais agudo e com mais alcance de mulher ou de rapaz muito novo. Se os sopranos forem homens, os puristas preferem chamar-lhes contratenores, que há quem confunda com contentores. Os sopranos dividem-se essencialmente em sete partes: soprano ligeiro, soprano lírico-ligeiro, soprano lírico, soprano lírico-spinto, soprano lírico-dramático, soprano dramático e soprano ultraligeiro. Também podem ser saxofones ou clarinetes, por exemplo. Nos Estados Unidos, os Sopranos ainda piam mais fino: são mais que as mães, maus como as cobras e convictos frequentadores de meretrizes. São extremamente mafiosos e profundos conhecedores, estes sim, de contentores, blocos de cimento e rios. Quando inadvertidamente apanhados por famílias inimigas, e desmembrados como manda a lei, os Sopranos são chamados, por divertimento, meios-sopranos. Os Sopranos americanos fizeram uma excelente série de televisão e agora vão dar em filme, que terá por título, corrigido, "Os Contratenores". O melhor Soprano do mundo (portanto, o pior) chamava-se Tony e padecia de ansiedade.

Os Bítalas
Os Bítalas eram um conjunto e cantavam obladi oblada. Eram quatro, sendo que o do bombo tinha cara de morcão, e chamavam-se Bítalas exactamente por terem cabelo grande, mas que afinal não era assim tão grande, como os hippies vieram depois a demonstrar - era apenas um cabelinho amaricado, aparadinho, muito anos vinte, muito tipo Beatriz Costa. Os Bítalas eram ingleses de Liverpool e do mundo. Em Portugal, no tempo em que imperava o corte à tigela (ou malga, consoante a parte do país), quem tivesse o cabelo a roçar as orelhas era Bítala. Eu fui, mas cantava num orfeão de manifesto pendor sacrista e por isso passei ao lado de uma grande carreira.
 
A vida é breve, a morte semifusa
Sabem: quando se acorda com aquela canção, aquela música na cabeça que nos embala o dia inteiro? Isso. Acordei com Adeste fideles na cabeça. Acordei e olhei para o rádio-relógio-despertador da mesinha-de-cabeceira - quatro da manhã. O habitualmente circunspecto rádio-relógio-despertador riu-se de mim, que eu bem vi. Fui à cozinha beber um copo de água e conferir o calendário - 1 de Outubro de 2020. O calendário riu-se de mim, tenho provas. Foda-se! Já nem o Natal é quando um homem quiser...

Fazendo a mínima
A diferença entre uma colcheia e uma colmeia está na medida. Isto é: uma colmeia corresponde exactamente a uma semicolcheia. E deve servir-se de preferência numa seminfusa. Bem fresca...

Andante con moto
O segundo andamento da 5.ª Sinfonia de Beethoven, dita Sinfonia do Destino, ou, só para complicar, melhor chamada Sinfonia n.º 5 em Dó menor Op. 67, deve ser tocado em Andante con moto. Isto é, pede-se um ritmo lento, como se fôssemos nós apenas a caminhar, naturalmente, um passo e depois outro, mas com o cuidado de não adormecermos de pé. Andante, sim, porém con moto. E isto é apenas um por exemplo.
Por outro lado, se o enxame de tuk tuk (ou auto-riquexós) que, uberdissimulados, tomou conta das ruas do Porto e cidades adjacentes deixasse de ser só para turistas e fosse, não sei como, integrado no sistema de transportes públicos da chamada Área Metropolitana, e que jeito que daria, já tínhamos um nome para a coisa: Andante con moto, exactamente. Mas isto é apenas outro por exemplo dos meus. 

P.S. - Hoje, 1 de Outubro, é Dia Mundial da Música. Ou Dia Internacional da Música. "Le solfège de l'école", assim se chamava, quem dera que não esteja a confundir-me, o meu primeiro livro de Teoria da Música.

Sem comentários:

Enviar um comentário