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sábado, 12 de outubro de 2024

O extraordinário alimentador de pássaros

Foto Hernâni Von Doellinger

Todas as manhãs, faça chuva ou faça sol, dias úteis ou dias inúteis. Todas as manhãs, de saquinho na mão, ele sai de Matosinhos atravessando o Passeio Atlântico de uma ponta à outra, em passo leve e decidido, e entra breve no Porto. No saquinho leva comida para os pássaros - milho para as pombas e pedaços de pão para os patos mas pouco, para os corvos-marinhos às vezes e para as vorazes e cagonas gaivotas. Sim. Para as gaivotas, raça tão desprestigiada hoje em dia, vítima de perseguição e tentativa de genocídio perpetradas por alguns autarcas aqui da beira-mar. Ele, o homem do passo leve e decidido, dá-lhes o almoço.
E todas as manhãs acontece o extraordinário: por alturas da Rotunda da Anémona, fronteira municipal, as pombas saem-lhe da cartola, materializam-se do nada, fazem-lhe bando por cima da cabeça e acompanham-no em revoadas dançarinas até à distribuição geral, no charco mais ocidental do Parque da Cidade, à porta da abandonada Kasa da Praia. As pombas reconhecem o seu benfeitor? Identificam o saquinho? Vão apenas ao cheiro? Serão, por assim dizer, o Espírito Santo em pessoa? Não sei - mas aquilo comove-me. Espanta-me. Fosse em Fátima, e seria certamente milagre.
Servido o festim, o cuidador de pássaros volta para casa pelo mesmo caminho, sempre com uma pequena reserva de pão e de milho no fundo do saco, prevenindo emergências que as há. Pomba tresmalhada ou retardatária, gaivota de asa caída ou manca ou qualquer outra ave freelance também têm direito à sua dose individual, no respeito do espaço de cada qual. É. Os solitários entendem-se...

Pois durante a pandemia, pela menos, o gentil alimentador da passarada desapareceu-me da vista. E a mim, caramba, fez-me diferença, porque eu dava-lhe valor. Fui também, no meu tempo de miúdo, em Fafe, um razoável pensador de galinhas e coelhos, e portanto havia ali qualquer coisa que me dizia respeito, que me enternecia e, verdade seja dita, também me abria o apetite, e vinha-me à cabeça o franguinho guiado pela minha avó de Basto na panela de ferro apurando ao borralho.
Felizmente o senhor das pombas voltou, e em grande forma. Uma sorte para ele, para os pássaros e também para mim, que estou sempre a ligar umas coisas às outras e sou tão dado a nostalgias, e se for à mesa melhor...

P.S. - Hoje é 2.º Dia Mundial das Aves Migratórias. O Dia Mundial das Aves Migratórias é duas vezes por ano, no segundo sábado de Maio e no segundo sábado de Outubro, coincidindo com as duas principais épocas de migração aviária.

No lago do

Foto Hernâni Von Doellinger

sexta-feira, 14 de maio de 2021

O bando dos três

Foto Hernâni Von Doellinger

Má sorte ser-se pega

A notícia espalhou-se como fogo em mato seco: um automobilista acabara de atropelar mortalmente uma pega, toda esmigalhadinha. Assassino! Juntaram-se imediatamente o PAN, Os Verdes, a Quercus, a Zero, a Protectora dos Animais, a Greenpeace, dois dirigentes da Juve Leo, um dos Super Dragões, sete das inexistentes claques do Benfica, trinta e dois indignados das redes sociais, quatrocentos youtubers, seis cães que tinham levado os donos a almoçar fora e vários elementos do movimento cívico e espontâneo SOS Grilo Careca de Asa Redonda e Perna Curta, que está muito bem organizado para estas emergências. Rodearam o carro, arrancaram o automobilista cá para fora e encheram-no de carolos e caneladas, para ele aprender. Só não chegaram ao linchamento porque, regra geral, desconheciam a palavra, e os poucos que a conheciam de vista confundiam-na com lixamento e achavam que, para lixar o energúmeno, os carolos e as caneladas já estavam muito bem.
Apareceu a GNR. A autoridade aproveitou para também molhar a sopa, quer-se dizer, o automobilista caiu sozinho sobre duas secretárias e esbarrou-se sem ninguém lhe tocar num armário ali no meio da via, e, posto isto, foi-lhe ordenado que se explicasse. O automobilista explicou-se. E convenceu. O PAN, Os Verdes, a Quercus, a Zero, a Protectora dos Animais, a Greenpeace, os dirigentes da Juve Leo e dos Super Dragões e das inexistentes claques do Benfica, os trinta e dois indignados das redes sociais, os quatrocentos youtubers, os seis cães da vida airada, os espontâneos do SOS Grilo Careca de Asa Redonda e Perna Curta e a própria GNR fartaram-se de pedir desculpas ao homem e até lhe deram os parabéns e os primeiros-socorros. Tudo não passara de um pequeno mal-entendido, erro de comunicação. Afinal o automobilista não tinha morto uma pega ou Pica pica melanotos, seria uma tragédia, tinha apenas atropelado mortalmente uma pega meretriz de beira de estrada, Femina sapiens solteira e mãe de três filhos, toda esmigalhadinha. É chato, mas são coisas que acontecem...

O pássaro do fraque

Foto Hernâni Von Doellinger

Schola cantorum

Foto Hernâni Von Doellinger

O vizinho da frente

Foto Hernâni Von Doellinger