terça-feira, 5 de julho de 2011

O peneirento

Há que tempos que não me vinha à cabeça a palavra peneirento. Veio-me ontem, com acento na penúltima sílaba e tudo - "peneirénto" -, como se diz na minha terra. E devo o momento de tocante nostalgia ao Dr. Fernando Nobre e à sua mais que esperada renúncia ao cargo de deputado. Muito obrigado, senhor doutor.
Arrumado contra-vontade no baú das expressões populares, o adjectivo peneirento tem vindo a ser substituído por sinónimos tão modernos como vaidoso, presumido, pretensioso, presunçoso ou pedante. Também estão bem para o caso em apreço, mas não são a mesma coisa.
Fernando Nobre, o antipolítico que apoiou Durão Barroso na ressaca pós-guterrista e depois se arrependeu, que apoiou Mário Soares, que apoiou o Bloco de Esquerda, que apoiou António Capucho (PSD) à Câmara de Cascais, que se apoiou a si próprio à Presidência da República, contra todos os partidos, e que logo a seguir teve uma recaída social-democrata para ser "candidato" à presidência da Assembleia da República, não vai deixar saudades, mas mete pena.
Este percurso aos ziguezagues, que acabou da pior forma com o tremendo estampanço no Parlamento, é o triste retrato de um homem de 59 anos que parece que nunca soube o que quer ser quando for grande. A não ser, ser importante, ser mais que os outros, como o poeta de Florbela.
Ser deputado da Nação é ocupação menor para o fundador da AMI. Nobre, que sonhara ser a primeira figura do Estado e avisou logo que nunca aceitaria ser menos do que o segundo na hierarquia nacional, saiu do Parlamento pela porta pequena e já sem o seu halo de santidade, deixado para trás das costas em estilhaços.
Ironicamente, a Wikipédia regista Fernando Nobre como "médico, activista, professor universitário e político português". Político português! A vaidade, o desastre que foi a sua breve passagem pela arena política, não pode apagar nem prejudicar sobretudo o seu trabalho humanitário de anos e anos. Foi uma pena, de facto, tudo o que ele se fez passar para tentar chegar ao poleiro mais alto. Nobre não merecia isto de si próprio. Até porque é certamente uma pessoa estimável, um português excelentíssimo. Mas peneirento.

6 comentários:

  1. Por favor, senhor Neques, não bata mais no salsicha Nobre. Olhe que o sr. Santos, que um dia aspirou a ser assessor do salsicha e que agora atravessa o rio todos os dias, pode não gostar...
    (Como sou bem mandado, sr. Neques, cá vim eu pôr a leitura em dia antes de ir para o esvaziamento do saco. Que querem?, há quem encha o saco, eu cá é mais de esvaziá-lo. É como os copos, não gosto deles cheios. Só espero é que não cortem nada que não devam...)
    P.

    ResponderEliminar
  2. Grande abraço. Vai correr tudo bem, amigo P. Mas não me apareças depois a falar fininho...

    ResponderEliminar
  3. O Sr. Santos regista que apreciou bastante o artigo em epígrafe. E que mais tem apreciado todos os assuntos glosados por V. Exa nesta casa onde abunda qualidade literária. Falta de tempo, porém, impede que por aqui passe mais amiúde.
    Sem mais de momento,
    Sr. Santos

    ResponderEliminar
  4. Seja bem aparecido, Sr. Santos! Um grande bem-haja pela simpática visita e pelo não menos agradável comentário.
    Volte sempre. A casa é sua.
    Sempre a considerá-lo,
    Neques

    ResponderEliminar
  5. Vamos lá a ver se esta coisa (m...a) dos comentários funciona ou não. Já agora, depois do "cunilingus lusitanus" há que abordar a temática dos eunucos lusitanos...

    ResponderEliminar
  6. Está a ver o meu bom amigo como funciona. Pois seja muito bem-vindo. E vamos então lá aos eunucos (isto é uma forma de dizer)...

    ResponderEliminar