sexta-feira, 7 de agosto de 2020

Bebo a isso!...

 Foto Tarrenego! 

A efeméride
Hoje, primeira sexta-feira de Agosto, é Dia Internacional da Cerveja. É um Dia De tão palerma e desnecessário como a maioria dos outros Dias De e foi inventado por uns maduros americanos de Santa Cruz, na Califórnia, em 2007. A efeméride deverá ser assinalada em meia centena de países de todo o mundo, incluindo Portugal, com todo o recato e sobriedade, no mais escrupuloso respeito pelas normas sanitárias em vigor. Isto até à primeira vomitadela ou até à segunda mijadela em público. Depois, é melhor chamar a polícia. O principal objectivo deste peculiar Dia De é, consta dos estatutos, estar com amigos para saborear a cerveja. Quer-se dizer, Dia Internacional da Cerveja é quando um homem quiser e a Direcção-Geral da Saúde deixar. E eu bebo a isso! Um quartilho de verde tinto, por exemplo...

O tempo das cervejas
Uma vez, em pleno pino de Verão, de férias, passeei Lisboa durante um dia inteiro sem beber uma cerveja, e bem era o tempo delas. Bati as capelas todas. Entrava aqui, entrava ali, e pedia "Uma Super Bock, se faz favor!", ou perguntava "Por favor, a imperial é Super Bock?", que não há e que não é - era Sagres e Sagres, respondiam-me invariavelmente, como se estivessem todos ensaiados e me conhecessem de algum lado. Bebi água como a minha mulher, eu quase morria, e foi a maior e mais perigosa acção de protesto que levei a efeito em toda a minha vida.

Quando a ilha do Sal ficou sem Super Bock
Ouço Tiago Nacarato no rádio. Canta "A Dança". Diz: "Mesmo que se acabe o stock / Da tão bem-vinda Super Bock / A vida é boa / A vida é tão boa / A vida é mesmo boa de se levar."
E lembro-me do Verão de 1990, na ilha do Sal, Cabo Verde. Agosto passava para Setembro, e a Super Bock esgotou sem remédio em toda a ilha. Fui eu.

A diferença
A diferença entre um embaixador da Unicef e um embaixador da Unicer é da ordem dos 5,2% vol.

O Zé Manel Carriço
O Zé Manel Carriço era um exagerado e provavelmente a pessoa mais extraordinária que conheci em toda a minha vida. O Zé Manel não comprava maços de tabaco, comprava volumes de tabaco, caixotes, camiões inteiros de tabaco, navios! O Zé Manel até comprou um jornal falido, até comprou um cinema, vejam lá! O Zé Manel comprava tudo, e a dinheiro, não acreditava no plástico. Por isso andava sempre com a carteira grotescamente amarrecada por um enorme molho de notas de conto como se fosse à feira do gado mercar uma junta de bois. Ou duas. Ou três. Ou. As notas chegavam e sobravam. O Zé Manel fazia questão que se soubesse. Ah!, e o Zé Manel Carriço era uma homem extremamente generoso.
Às vezes o José Manuel, que de baptismo era Rodrigues, levava-me a umas noitadas privadas (ele, o Pimenta e eu) no Peludo antigo, mesmo em frente ao seu excêntrico atelier, o que nos era de uma extrema comodidade. As noitadas entravam pela madrugada dentro, porque o Zé Manel tinha muito que contar e nós gostávamos de ouvir. O Sr. Avelino fechava para nós. Comia-se um marisquito, que àquelas altas horas estava nas últimas, e sobretudo bebia-se cerveja, finos, com tremoços, para fazer boca. Mais do que uma vez esgotámos o stock de copos, enchendo sete ou oito mesas à nossa volta, o café inteiro, porque o Sr. Avelino gostava de fazer a conta no fim. Partiam-se alguns, o Sr. Avelino afinava, tomava nota para acrescentar ao rol. Mas o pior era o desbaste nos tremoços, que pedíamos repetidamente por uma questão de princípio.
Uma noite o Sr. Avelino não aguentou e queixou-se: - Sr. Zé Manel, assim não pode ser, já comeram mais de dez pires de tremoços. É um prejuízo muito grande. Os tremoços custam-me dinheiro, valha-me Deus!...
O Zé Manel foi ao bolso do casaco, sacou da carteira marreca, tirou uma mão-cheia de notas e disse séria, calma e secamente: - Ó Avelino, traz-me cinco contos de tremoços! - e pousou o dinheiro como mão de póquer em cima da única mesa de vago, que era a nossa...

A receita
- Passa-me a receita, se faz favor?
- Mas com certeza, ora tome lá.
- Hummm... precisava de mais um bocadinho de cerveja e menos açúcar.

Anthony Bourdain não sabia
Numa das suas visitas oficiais ao Porto e Norte de Portugal, Anthony Bourdain (1956-2018) andou pela Invicta, deu um salto aos vales do Douro e do Tâmega, comeu umas especialidades de carregar pela boca e teve o duvidoso privilégio e manifesto incómodo de assistir a uma matança de porco e às litúrgicas operações de desmancho e salga, acabando o dia a jogar à bola com a bexiga do bicho, como mandava a tradição.
E depois foi-se embora. Atenção: foi-se embora sem antes ir à Conga comer uma bifana. Mas, desta ou doutra vez, comeu bifanas em Lisboa. Isto cabe na cabeça de alguém? As bifanas da capital sempre me mereceram as maiores reservas e, francamente, a equipa do No Reservations deveria estar na posse desta importante informação.
Bourdain disse que gostou muito das lisboetas "sanduíches gordurosas de porco", com carne "imunda e cortada em fatias finas". É uma definição elegante e que se aceita. Mas havia de ter provado as do Porto, na Rua do Bonjardim! E não me venham dizer que as bifanas são iguais em todo o lado. Porque não são. E não me venham dizer que é só temperar com vinho branco e mais não sei quê (o resto fica cá comigo, que também as faço uma categoria). Porque não é. É com o vinho (e com o resto), mas também com cerveja, ou para onde é que vocês cuidam que vão as sobras dos barris e a espuma que esborda dos finos (ou imperiais) mal tirados? Vai tudo lá para dentro, para o caldeirão da molhanga, e aqui é que bate o ponto. Aqui é que a porca torce o rabo. É que as bifanas do Porto chafurdam em Super Bock. E isso faz toda a diferença.

Cientificamente provado
O álcool afecta de forma diferente o homem e a mulher. O mercurocromo não.

Contra a discriminação do mercurocromo, sempre!
Foi notícia: em 2015 Portugal ocupava um honroso nono lugar ex aequo no ranking mundial dos países com maior consumo de álcool. Feitas as contas, cada português (incluindo os portugueses que não bebem) bebeu naquele ano uma média de 12,5 litros de álcool. O relatório da Organização Mundial da Saúde então divulgado era uma vez mais omisso no que diz respeito aos números do consumo de mercurocromo. O que se lamenta.

O intoterante
Era realmente uma pessoa com um feitio difícil. Tinha um problema com o álcool. E outro com o betadine.

Ó prima, ó rica prima!
Eu tinha umas primas de que não sabia. Foram-me apresentadas há coisa de dois ou três anos pelo meu amigo Paulo Silva, que as conhecia de ginjeira, e desde então não lhes largo as redondezas. Falei nelas no outro dia, disse ao Paulo que havíamos de ir às minhas primas e logo mentes perversas pensaram que eu estava a agendar uma noitada na casa da tia, melhor dizendo: em casa de tia. Mas nada disso. As primas de Leça do Balio são as Erdinger, as excelentíssimas cervejas alemãs que, como o seu próprio nome indica, são praticamente da minha família. E preciso urgentemente de fazer uma festa de despedida.
As Erdinger são infelizmente uma raridade nas prateleiras dos hipermercados. Descubro muito às vezes meia dúzia delas, e vêm logo todas comigo para casa. Mas há um certo sítio, uma esplanada num certo parque junto ao ex-rio mais poluído da Europa, onde costumo marcar encontro com elas e elas não costumam falhar. Parece traição à Pátria, mas é exactamente em Leça do Balio, o berço desse verdadeiro monumento nacional e património material da humanidade que é a Super Bock.
Para beber a Erdinger em casa como manda o figurino, até tive de comprar um copo, caro, enorme, bojudo e cheio de curvas, e é destas redondezas que eu falo. Estou a pensar vendê-lo, ao copo. As minhas primas que me perdoem, mas começam a estar muito acima das minhas posses. E não é que volte para os braços da Super Bock, não. Vou mesmo para a água, e da torneira, pelo menos enquanto não a vierem cá cortar. Portanto, adeus ó primas, ó ricas primas! 

Já há anos, seis ou sete, que não vou a casa das primas, ricas primas, e as raparigas, há quem me conte para fazer raiva, continuam boas como o trigo. Estou farto de dizer à minha mulher: a família devia dar-se mais!

Eflúvios amorosos
"Cheiras a cerveja", disse ela. "Aproveita", disse ele.

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