segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

Alceu Amoroso Lima

Considero a crítica literária não como uma atividade parasitária da literatura de criação e a ela contraposta, mas como uma atividade autônoma, apenas distinta da atividade criadora, mas cheia de contatos com ela e representando, antes de tudo, uma concepção geral da existência. Nisso está, creio mesmo, a grande dignidade e a grande responsabilidade da crítica literária, que passa assim, de atividade subordinada, a esforço intelectual livre e original. E a esforço que implica não apenas em uma atitude analítica mas sintética; não apenas de comentário e julgamento, mas ainda de construção própria; não apenas de anotação aos livros estranhos, mas de visão própria; não apenas literária, mas vital. É uma visão geral da vida. Não uma visão livresca, nem só literária ou mesmo exclusivamente estética. Alguém que faz da crítica a sua vivência habitual (e julgo indispensável abrasileirar o espanholismo, tão justificável como existência, de existir) - não pode limitar-se a ver nela apenas um conjunto de anotações às atividades estéticas ou intelectuais dos outros. E a vida toda que tem diante dos olhos. Deve fazer da crítica um modo de exprimir sua própria visão total da vida. Tudo, portanto, entra no domínio da crítica, já que a atividade filosófica - contida na concepção geral da vida – compreende a universalidade das coisas, consideradas em suas relações mais gerais, em suas origens, em seus fins, em suas raízes. Filosofia, poesia e oração se tocam, intimamente, por essa insatisfação das aparências. O crente, o poeta e o filósofo querem vencer, por suas próprias forças, a servidão das superfícies e penetrar no âmago das coisas, dos segredos, dos silêncios... A crítica pertence a esse conjunto de atitudes no espírito. [...]

"O Crítico Literário", Alceu Amoroso Lima

(Alceu Amoroso Lima, que usou o pseudónimo de Tristão de Ataíde, nasceu no dia 11 de Dezembro de 1893. Morreu em 1983.)

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