sexta-feira, 28 de julho de 2017

Bolinhos de bacalhau no Tarrenego!

A problemática dos bolinhos de bacalhau
"Dois painéis de jornalistas do jornal Público e especialistas em gastronomia", um painel em Lisboa e outro painel no Porto, "reuniram-se" para provar bolinhos de bacalhau (pastéis de bacalhau, para quem lê na capital) comprados fresquinhos "em diferentes pastelarias nas duas cidades". Diz o matutino que foi uma desilusão: as amostras recolhidas reprovaram todas por indecente e má figura...
Mas de que é que estavam à espera os ilustres paineleiros? Bolinhos de bacalhau em Lisboa e no Porto? E de pastelarias e cafés, percebi bem? Panikes e croissants com chocolate, isso é que os dois comités de sábios deveriam ter provado...

P.S. - Escrito e publicado originalmente no dia 3 de Março de 2013.

Os bolinhos da Albertinha da Lameira
Os melhores bolinhos de bacalhau do mundo eram os da Albertininha da Lameira, em Fafe. Contava a lenda que eram moldados no sovaco da prendada cozinheira, o que lhes emprestaria aquele gosto tão peculiar. A vila antiga dava-se muito a estas lendas: dizia-se também, por exemplo, que os tremoços da Marrequinha da Recta eram a especialidade que eram porque a boa senhora lhes mijava.
A verdade é esta: ainda cheguei a ver a Albertininha, numa tarde de sábado, a fazer a massa dos famosos bolinhos, de alguidar entre as pernas, junto ao fogo da lareira, mas a história do sovaco enformador era uma treta - isso posso jurar, e tive pena.
Os bolinhos do Manel do Campo também eram de se lhes tirar o chapéu. E, de um modo geral, as pensões e os tascos de Fafe faziam gala de confeccionar e servir um produto, como agora se diz, fiel às origens e de altíssima qualidade. Esta tradição local mantém-se, em sítios como, veio-me agora a ideia à boca, o Fernando da Sede (Adega Popular). Os bolinhos de bacalhau com salada de feijão-fradinho e arroz do Fernando surpreendem e encantam os visitantes, e, para os da terra, são uma esplêndida entrada para a vitelinha que há-de vir. Mas isso, nos tempos que correm, é já refeição a pedir uma segunda hipoteca da casa.
É. Os bolinhos "de morrer por mais" são no Minho - bem o sabia mestre Aquilino. Em Fafe, é claro, mas também no Manuel Padeiro e no Gaio, em Ponte de Lima e em dias sim, ou no Conselheiro, em Paredes de Coura, sempre. Em sítios assim, que os há bons e tantos.
Parece-me tolice, portanto, criar uma task force de "especialistas" e simpatizantes, como fez o jornal Público, para provar bolinhos de bacalhau comprados em pastelarias e cafés de Lisboa e do Porto. Ainda por cima, os lisboetas chamam "pastéis de bacalhau" aos bolinhos de bacalhau. (É como os franceses chamarem "fromage" a uma coisa que toda a gente sabe que é queijo). Só podia dar merda e deu. Já se sabia. Já deviam saber. Qual era a ideia? E tomem nota os doutos paineleiros: o resultado seria o mesmo se mandassem vir arroz de grelos, pastelões de petinga, pataniscas ou caldo de nabos. Os cafés e as pastelarias do Porto e de Lisboa não são para esses preparos, estão a perceber? Vá lá, o caldo de nabos... talvez.

P.S. - Escrito e publicado originalmente no dia 5 Março 2013.

Os piores bolinhos de bacalhau do mundo
O piores bolinhos de bacalhau do mundo são num pequeno café, em Penafiel. Três mesas, dois jornais, um balcão sumário e a simpatia imensa do dono. Os bolinhos são tão maus, tão maus, que nunca falho quando por lá passo a horas de aperitivar. Meto o pé no degrau da entrada, ao baixo, e sai logo meia dúzia de pedras de gelo directamente da arca frigorífica para a fritadeira de óleo cansado, que é "Para o senhor, para serem fresquinhos". Agradeço a deferência e reservo-me. Cinco minutos, não mais. As pedras de gelo vêm para a mesa a ferver e a pingar, agora em forma aparentada com a dos verdadeiros bolinhos de bacalhau, queimam-me a boca e antes assim, que enganam o paladar. Não sabem ao bacalhau que não têm, mas também não sabem à batata que são só. Escangalham-se ao toque. São maravilhosamente intragáveis e eu como-os. Já disse: o patrão é gente boa e tem três mesas e dois jornais no estabelecimento. Sei dar valor às coisas verdadeiramente importantes. Para apagar o incêndio, bebo uma taça de um obscuro vinho branco de cápsula que sabe a remédio mas não faz bem.
A minha mulher e eu descobrimos o cafezinho por acaso e já lá levei três ou quatro amigos. Para provarem "os piores bolinhos de bacalhau do mundo", é o que lhes prometo, e os amigos depois concordam. Aqueles bolinhos nunca me deixaram ficar mal. Merecem um prémio.
Até porque nos abrem horizontes. A seguir, íamos à Pita Arisca, em Lousada, comer o melhor cabrito do mundo...

P.S. - Escrito e publicado originalmente no dia 6 de Março de 2013. 

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