quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Fafe mata mas não esfola

Foto Hernâni Von Doellinger

Ao contrário (nunca se deve começar um texto com a expressão "ao contrário"), mas, como dizia, ao contrário de uns certos e determinados palermóides, fafenses ou nem por isso, que têm vergonha da Justiça de Fafe, eu não tenho. É verdade: tenho é orgulho. Gosto da lenda da Justiça de Fafe, acompanha-me desde que eu nasci, identifica-me pelo mundo fora, e até aprecio o monumento, embora o desejasse mais central.
aqui escrevi: a Justiça de Fafe é a metáfora folclórica de uma gente de paz que não gosta de levar desaforo para casa, ou que costumava não gostar. Nós, os fafenses. O resto é treta, mais ou menos erudita. Geralmente menos. "Com Fafe ninguém fanfe" quer dizer, tão-só, com Fafe ninguém se meta. Porque, quem se meter, quem nos ofender de graça, recebe o troco, e que mal tem isso? E, no entanto, muito boa gente confunde, hoje em dia, este velho sentido de verticalidade com fazer justiça pelas próprias mãos. Não é nada disso. A Justiça de Fafe deve ligar-se, antes, à defesa da honra. A coça é semântica.
É isto e mais nada. Nem luta de classes, nem administração de justiça privada, nem apologia da justiça popular, nem jogo do pau, nem fanfarronice, nem sacholadas, nem pistolas e navalhadas, nem Felizardos, nem bordoada por dá cá aquele copo. Tudo equívocos. As lendas têm costas largas, de toda a conveniência para o caso em apreço, mas saber ler antes de escrever também nunca fez mal a ninguém, e sobretudo aos alegados historiadores.
Não vamos mais longe. Podíamos ir à Porca de Murça, mas não vamos mais longe: deitemos os olhos a Guimarães, que após Arões é sempre ao baixo e sem portagens. A vaidade que os nossos vizinhos têm na estátua de D. Afonso Henriques, esse gandulo que usava saias e batia na mãe! Ainda por cima, existiu mesmo, e a nossa Justiça de Fafe é só bazófia, invenção - mas é a coisa mais bonita a que nos podemos agarrar, para além da forca de Moreira do Rei...
Os reis de Espanha vieram no outro dia a Portugal e o nosso presidente Marcelo levou-os a Guimarães e à estátua do tratante, do Afonsinho: a Letizia e o Felipe puseram-lhe flores. Em Fafe, a Câmara Municipal inventou um pedregulho Por Baixo da Arcada, no salão nobre da cidade, para poupar aos ilustres e televisivos visitantes o embaraço de se cruzarem com a Justiça de Fafe ela própria.

Que Fafe mata é verdade. Não por acaso, a Câmara Municipal faz questão de abrilhantar o programa das tradicionais Feiras Francas, lá pelos meados de Maio, com uma extraordinária largada de perdizes tontas, condenadas à matança à-seja-ceguinho. E organiza ou apoia também batidas à raposa e montarias ao javali. Atenção: raposas, javalis e ursos polares em Fafe são mato, uma verdadeira epidemia. Tal como as perdizes de aviário.
Por outro lado, a Câmara Municipal de Fafe gosta muito de animais, coitadinhos dos bichos. Acolheu há dias a 44.ª Exposição Nacional e Pré-Olímpica de Columbofilia e no próximo mês de Fevereiro fará o favor de nos deliciar com a X Exposição Canina Nacional de Fafe. Quer-se dizer: desde que (eventualmente) dê na televisão ou pelo menos no Facebook, para a Câmara está bem...

P.S. - Ainda sobre a Justiça de Fafe e sonsos programas de televisão a pagar pelos munícipes-contribuintes, recomendo a leitura deste texto, que está fresquinho. Com o jogo das cadeiras aí à porta, e com os aboletados e ex-aboletados do costume atarefados nas traições do costume (o PS é mesmo um saco de gatos, dasse!...), cada vez percebo menos que a minha terra se dê a luxo se desaproveitar as cabeças verdadeiramente pensantes e arejadas de homens de princípios e honra como, por exemplo, e sem ofensa àqueles de que me esqueço ou não conheço: Pedro Sousa, António Daniel, Miguel Summavielle ou Ricardo Gonçalves - já viram que equipa?! Há quatro ou cinco anos convenci-me de que o Ricardo haveria de dar, mais cedo ou mais tarde, um excelente presidente da Câmara de Fafe. Informo-me com regularidade acerca do seu trajecto, e não tenho razões para mudar de ideia...

9 comentários:

  1. Obrigado, Hernâni. Concordo com a ideia acerca do Ricardo. Abraço.

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    1. Meu caro Hernâni:
      Quão distante tu estás da realidade fafense (aparentemente, o Daniel também)!
      A nomenkelatura está cada vez mais forte e cada vez menos interessa quem pense pela sua cabeça.
      Abraço grande e juro que não levo a mal o que escreveste.

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    2. Os teus dois primeiros parágrafos dão-me razão, Ricardo...
      Grande abraço.

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  2. Grande Hernâni... Ainda nos vamos juntar num grande projeto para Fafe... E, pelos vistos, já temos presidente. 😁 Abraço

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  3. Acutilante e bem escrito... à fafense! E revela a inexplicável vergonha dos nossos gestores de fazerem justiça à melhor cidade rural do país! O tema abordado foi amplamente discutido por muitos dos nomes mencionados no texto, aquando de uma edição/tertúlia da revista Alfa (n.º6) do Pedro Sousa. Coincidências ou não os nomes repetem-se, porque será? :)

    Ricardo à presidência? Hum.... :) Quero saber mais ....

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