segunda-feira, 25 de julho de 2016

Um bobsleigh em segunda mão

                                                                                                         Foto Hernâni Von Doellinger

No tempo dos sonhos eu tive um: comprar um bobsleigh em segunda mão, pegar na mulher, no filho e no futuro e mudarmo-nos os quatro para Santiago de Compostela, que era o estrangeiro que me estava mais à mão e nós gostávamos razoavelmente derivado às ruinhas, às tapas e às cañas e por, a bem dizer, nem ser estrangeiro. Melhor dito, gostamos muito. Mas hoje em dia: a Galiza anda tão à rasca como a gente, já não é oficialmente estrangeiro e saraiva por mais que saraive, ainda que em galego, não é neve nem embala. Ia fazer o quê com o bobsleigh na Praça do Obradoiro? (Do Obradoiro, rico nome...) Ainda por cima, os gandulos do lado de cá cortaram-me as vazas, entesaram-me até ao cutão. Desisti portanto do bobsleigh e tirei o passe do metro para a Senhora da Hora. Segundo julgo saber, na Senhora da Hora não neva há variados anos por uma questão de princípio. Que se segue: de bolsos vazios e sonhos roubados, fico olimpicamente em casa à espera do Verão de que não gosto e que, por acaso, me incomoda. Sem bobsleigh, sem ruinhas, sem tapas e sem cañas. Uma seca que só visto...
Sou dado a invernos. Para mim, melhor que chova em Santiago. E que neve e que gele. Ou então nada disso, que, ao ponto a que chegámos, também não interessa - mas Santiago, sempre Santiago, mesmo sem bobsleigh e ainda que faça sol. Um dia destes lá iremos, eu, a mulher, o filho e o futuro, pobres e a pé, se Deus quiser, mas vamos. E tem de ser rápido, antes que os senhores Jeroen Dijsselbloem e Wolfgang Schäuble, cínicos de profissão e governadores de Portugal, nos interditem a vida em primeira mão.

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