sexta-feira, 27 de maio de 2016

Até para se ser pega é preciso ter sorte

                                                                                                                Foto Hernâni Von Doellinger

A notícia espalhou-se como fogo em mato seco: um automobilista acabara de atropelar mortalmente uma pega, toda esmigalhadinha. Assassino! Juntaram-se imediatamente a Quercus, o PAN, a Protectora dos Animais, a Greenpeace, dois dirigentes dos Super Dragões e vários elementos do movimento cívico e espontâneo SOS Grilo Careca de Asa Redonda e Perna Curta, que está muito bem organizado para estas emergências. Rodearam o carro, arrancaram o automobilista cá para fora e encheram-no de carolos e caneladas, para ele aprender. Só não chegaram ao linchamento porque, regra geral, desconheciam a palavra, e os poucos que a conheciam de vista confundiam-na com lixamento e achavam que, para lixar o energúmeno, os carolos e as caneladas já estavam bem.
Apareceu a GNR. A autoridade aproveitou para também molhar a sopa, quer-se dizer, o automobilista caiu sozinho sobre duas secretárias e esbarrou-se sem ninguém lhe tocar num armário ali no meio da via, e, posto isto, ordenou-lhe que se explicasse. O automobilista explicou-se. E convenceu. A Quercus, o PAN, a Protectora dos Animais, a Greenpeace, os dirigentes dos Super Dragões, os espontâneos do SOS Grilo Careca de Asa Redonda e Perna Curta e a própria GNR fartaram-se de pedir desculpas ao homem e até lhe deram os parabéns. Tudo não passara de um pequeno mal-entendido, erro de comunicação. Afinal o automobilista não tinha morto uma pega ou Pica pica melanotos, seria uma tragédia, tinha apenas atropelado mortalmente uma pega meretriz de beira de estrada, solteira e mãe de três filhos, toda esmigalhadinha. São coisas que acontecem...

(Texto escrito e publicado no passado domingo, dia 22 de Maio de 2016. Repito-o hoje para lhe meter a pega com quem estive esta manhã no Parque da Cidade do Porto. Mostro-a de costas, evidentemente, para não ser reconhecida...)

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